José Saramago

domingo, 7 de abril de 2024

Pertubações...


Opiniões

Narrativa autobiográfica,  com intensidade emocional e linguística.

 «Tempo de leitura: quatro horas. Tempo de recordação: a vida inteira.»

 «mistura de frivolidade circunstancial e sabedoria autoritária.» 

 «[Uma escrita] de pequena escala, intensa, impecavelmente incisiva.» 

«Sublime, áspero, triste.» 

 «Uma narrativa simultaneamente apaziguadora e inquietante» 


 As protagonistas são a linguagem de uma amizade queer juvenil. 
 

 «Passaram tantos anos, e ainda torno a ver o seu rosto, um rosto que busquei noutras mulheres, que nunca encontrei. Era muito íntegra. Uma coisa perigosa. […] Nunca demos a mão e tê-lo-íamos achado ridículo. Viam-se pelos caminhos rapariguinhas de mão dada, a rirem-se, a fazerem de amigas, a fazerem de amantes,  em nós, havia uma espécie de fanatismo que impedia qualquer efusão física.»



Uma mulher culta, independente, divorciada e já com filhos adultos, apaixona-se por um homem casado, estrangeiro, mais jovem. Durante dois anos, esperar por ele torna-se um objetivo de vida...Um tema banal, mas que não se reduz ao sentimentalismo piegas de uma " paixão simples". 

Uma história autobiográfica, muito bem escrita. 





 They slither wildly as they slip away across the universe Pools of sorrow, waves of joy are drifting through my opened mind Possessing and caressing me

    Em 1963, Annie Ernaux,  uma estudante de 23 anos, engravida do namorado que acabara de conhecer. Sem poder contar com o apoio dele ou da própria família numa época em que o aborto era ilegal em França, ela vive praticamente sozinha o acontecimento que analisa neste livro quarenta anos depois, quando já é uma das principais escritoras de seu país. Com a ajuda de entradas do seu diário e de memórias há muito guardadas, Ernaux reconstrói seu périplo solitário para realizar um aborto clandestino. Quando por fim encontra uma “fazedora de anjos” disposta a realizar o serviço, a jovem acaba na ala de emergência de um hospital. Anos se passam sem que ela tenha coragem de revisitar o episódio. Ernaux encontra o caminho para falar publicamente do seu aborto e fazer da literatura uma profissão de fé, que comove pela honestidade cortante: “o verdadeiro objetivo da minha vida talvez seja apenas este: que meu corpo, as minhas sensações e os meus pensamentos se tornem escrita, isto é, algo inteligível e geral, a minha existência completamente dissolvida na cabeça e na vida dos outros”. 



 É comovente a admiração que o narrador tem pelo pai, um médico que dedica a vida aos doentes até ao dia em que é assassinado no centro de Medellín, com um poema de Borges no bolso...

 El olvido que seremos 

“Ya somos el olvido que seremos. 
  El polvo elemental que nos ignora 
y que fue el rojo Adán y que es ahora
 todos los hombres y que no veremos. 
Ya somos en la tumba las dos fechas 
del principio y del término, la caja, 
la obscena corrupción y la mortaja, 
los ritos de la muerte y las endechas. 
No soy el insensato que se aferra 
al mágico sonido de su nombre; 
pienso con esperanza en aquel hombre
 que no sabrá que fui sobre la tierra.
 Bajo el indiferente azul del cielo 
esta meditación es un consuelo.”

É um dos paradoxos mais tristes da minha vida: quase tudo o que escrevi foi escrito para alguém que não pode ler-me..." Héctor Abad Faciolince

 
 
Oslivros são um simulacro de recordação, uma prótese para recordar, uma tentativa desesperada de tornar um pouco mais perdurável o que é irremediavelmente finito.

 em casa viviam dez mulheres, um menino e um senhor. 

 Um dia tive de escolher entre Deus e o meu pai, e escolhi o meu pai. O meu pai deixava-me fazer tudo o que eu quisesse. / O meu pai nunca tinha dinheiro suficiente porque estava sempre a dar ou a emprestar... / Quando eu chegava a casa, o meu pai...abraçava-me, beijava-me, dizia-me um monte de frases carinhosas... / Sem esse amor exagerado que me deu o meu pai eu teria sido alguém muito menos feliz. / Alguns dos meus parentes diziam que o meu pai ia acabar por fazer de mim um maricas, com tanto mimo./ Para o meu pai era importante que os filhos soubessem que nem toda a gente era feliz e afortunada como nós.../

Se não sou antissocial e suportei atentados e tristezas e ainda continuo a ser pacífico, acho que foi porque o meu  pai gostava de mim , tal como eu era.

Quando fui para o infantário...senti-me abandonado e maltratado. 

A minha mãe dizia sempre "meninas", porque havia mais meninas e, nessa época, a regra gramatical(um homem entre mil mulheres converte tudo no género masculino) não contava para ela. / A minha mãe era filha do arcebispo de Medellín...

Para a minha mãe,  só havia um  sítio bom para vivr, a Colômbia, e apenas um bom parteiro...A segurança económica que ela proporcionava à família permitia ao meu pai ser profundamente consequente com a sua independência económica e mental.

Devido ao exemplo do pai e da mãe,  um casal feliz, as minhas irmãs e eu sabemos; que há apenas um motivo pelo qual vale a pena ter algum dinheiro :para poder conservar e defender a todo o custo a independência mental sem que ninguém nos posso submeter a uma chantagem laboral que nos impeça de ser quem somos.

 Se quiseresque o teu filho seja bom, fá-lo feliz; se quiseres que seja melhor, fá-lo ainda mais feliz. Fazemo-los felizes para que sejam bons e para que, depois, essa bondade aumente a sua felicidade. 

 É com base na felicidade e no amor queHéctor Abad Faciolince cresce numa casa dominada pelas mulheres – a sua mãe, as suas cinco irmãs, Maryluz, Clara, Eva, Marta e Sol, duas criadas, Emma e Teresa, a ama da sua avó Tatá e uma freira – e pela religiosidade, numa educação católica, com referências à Nossa Senhora de Fátima e aos Três Pastorinhos da Cova da Iria, apesar do ateísmo do seu pai, que lhe ia fornecendo alguns antídotos sobre os assuntos da religião e das crenças religiosas, revelando>no entanto que é fundamental e indispensável a crença espiritual e existencial, mas que todos os fundamentalismos são perniciosos.


Este esquecimento  que seremos poderá adiar-se por mais um instante , no fugaz reverberar dos seus neurónios , graças aos olhos, poucos ou muitos, que alguma vez se detiveram nestas letras. 

 FIM



















"A essência da condição humana está no caos, não na norma"


    Ninguém nasce de uma vez. Nascemos aos poucos, pelo tempo fora. Vamo-nos juntando à medida que nascemos. Vamo-nos desconjuntando à medida que vivemos. Nunca chegamos a estar inteiros. Eu, por exemplo, nasci um dia, estava então no primeiro ano do liceu.

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