Debate imemorial entre contemplativos e ativos...
É pouco provável os contemplativos entregarem-se aos jogos de proxenetas, tornarem-se proxenetas ou bêbados; em regra, não pregam a intolerância nem fazem a guerra; não se veem na necessidade de roubar, de vigarizar o próximo ou de oprimir os pobres.
A espécie mental a que Blake pertencia é relativamente abundante... o visionário desprovido de talento talvez apreenda uma realidade interior não menos tremenda, bela e significativa do que o mundo contemplado por Blake, mas falta-lhe a capacidade para exprimir aquilo que viu.
A mescalina é completamente inócua e os seus efeitos dissipam-se ao fim de oito ou dez horas
Toda a nossa educação é predominantemente verbal e, portanto, mostra-se incapaz de cumprir a missão que lhe deveria caber. Em vez de transformar crianças em adultos plenamente desenvolvidos, produz estudantes de ciências, completamente alhheios à natureza...lança no mundo estudantes de humanidades que nada sabem acerca da natureza humana , a deles próprios ou a dos outros.(...) Para as pessoas mais educadas é quase impossível dedicar uma atenção genuína a tudo o que não sejam palavras e conceitos.(...) As humanidades não verbais, as artes de tomar consciência direta dos factos adquiridos da nossa existência, são quase completamente ignorados.(...) Além disso, este tema da educação das humanidades não-verbais não se encaixa em nenhum dos compartimentos predefinidos.
Opinião de António Ribeiro:
"Ouço falar deste livro desde que me lembro. Mas nunca tinha posto mãos à obra.
Tornou-se um clássico da contra-cultura norte americana da década de 1960, principalmente depois de Jim Morrison ter batizado os “The Doors” a partir do seu título.
E isso é uma injustiça que se lhe faz (ao livro). A única coisa que liga este livro a esse imaginário do “Verão do amor” é apenas o facto de ter como episódio inicial uma experiência com mescalina, o princípio activo existente no “peyotl”, uma raiz consumida pelos indígenas do México.
Aldous Huxley foi, desde muito jovem, um leitor atento dos místicos cristãos. As referências que ele vai citando não deixam dúvidas: o monge dominicano alemão Eckhart, o franciscano flamengo Ruysbroeck, e, finalmente, o carmelita S. João da Cruz, talvez a referência mais citada no livro. O homem que descreveu admiravelmente a angústia da “noite do espírito”. Todos estes autores se inscrevem na escola da mística designada por abstracta ou “apofática”, frequentemente perseguida pela Inquisição.
Huxley afirma que, na sua juventude, não gostava destes autores, que considerava uma espécie de “budistas ocultos”. Mas acabou por compreender que entre a mística cristã, budista, sufi (o misticismo islâmico) e outras existem analogias formais que são inegáveis.
A tese de base do livro é a de que o cérebro humano se destina unicamente a regular a nossa economia animal, e que o uso de ascese e meditação, ou em alternativa o uso de químicos, pode fazer descer as funções cerebrais a níveis mínimos, permitindo aos seus praticantes o acesso a um estado de consciência transcendente.
Em face da experiência que ele descreve, comparando com outras nas obras dos autores que Huxley refere e que eu, em tempos, também li, existem de facto analogias formais muito sólidas.
Ao contrário de Huxley, eu só li, nunca experimentei. É bom lembrar que estes autores deixam bem claro que a viagem ao universo interior pode ser uma experiência devastadora e irreversível.Até por isso é sempre bom deixar espaço à dúvida."
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