Artigo de Luís Ricardo Duarte
Se há escritores que definem, desde os primeiros romances, um universo que depois escavam com a intensidade de um mineiro, outros há que se armam da ousadia de um navegador. É o caso de Gonçalo M. Tavares, cuja obra assenta, em parte, na ideia de experimentação. Com ele já fomos até à Índia, numa reinvenção da epopeia clássica, viajámos à velocidade do pensamento (em Canções Mexicanas) e investigámos temas de dança, ciência ou música.
Também assim se pode ler Cinco Meninos, Cinco Ratos, segundo volume da série Mitologias (inaugurada, em 2017, com A Mulher-Sem-Cabeça e o Homem-do-Mau-Olhado). É a “extensão do domínio de luta literária” ou, para usar outra expressão do escritor Michel Houellebecq, um novo território de um mapa em constante ampliação. Este continente define-se pela citação de Walter Benjamin que encerra o livro anterior: “Todas as manhãs somos informados sobre o que de novo acontece à superfície da Terra. E, no entanto, somos cada vez mais pobres de histórias de espanto.” Cinco Meninos, Cinco Ratos recusa a torrente de explicações que envolve qualquer acontecimento na sociedade da informação. As personagens conhecem-se pelos seus principais atributos (Nómada, Velocidade, Povo-Já-Amaldiçoado) e nem todas as leis da física e, sobretudo, da moral são respeitadas.
Artigo de Bruna Meneguetti
Teogonia é o primeiro livro de mitos que narram a origem dos deuses. Seu autor foi Hesíodo, nascido no século 8 a.C., e sua obra reflete como os mitos foram usados para explicar fenômenos naturais. Com os sofistas, porém, o mito perde sua importância, sendo considerado o antecessor do pensamento filosófico e, portanto, deixando de explicar o mundo. Mas é no livro Poética, de Aristóteles, que a palavra é retratada como sinônimo de “fábula”. Assim, não à toa, a ideia de algo mitológico nos remete ao passado e quando tentamos pensar nos mitos da atualidade sentimos como se tivéssemos perdido a capacidade de produzir algo que antes nos parecia tão natural e intrínseco.
Nesse sentido, o escritor português Gonçalo M. Tavares é corajoso ao escrever e chamar seus dois novos livros, publicados no Brasil pela Editora Dublinense, de “série mitológica”. O livro que abre suas mitologias, A Mulher-Sem-Cabeça e o Homem-do-Mau-Olhado, e o segundo publicado por aqui, Cinco Meninos, Cinco Ratos, não poderiam se encaixar em outra definição. Com personagens, além dos já citados nos títulos, como a Revolução, o Comboio, a Avestruz, o Povo-inteiro, os Homens-Com-a-Cabeça-Perto-do-Chão e Moscovo, Gonçalo entra definitivamente no terreno mitológico para trazer lampejos da história dos quatro últimos séculos. “Se houve alguma influência, tem a ver com esta ideia de pensar numa mitologia para o século 21. Pensei que de alguma maneira falta uma mitologia que introduza também a máquina”, afirma Gonçalo em entrevista ao Aliás.
O escritor usa de cinco crianças (Alexandre, Olga, Maria, Tatiana e Anastácia, esta última sempre perdida) para conseguir atravessar as histórias dessas mitologias, como se os pequenos acompanhassem a narrativa, ou vice-versa. A escolha de seus nomes vêm dos cinco filhos do Czar Nicolau II, assassinado na revolução comunista. Juntos, os personagens criam nos livros uma estreita relação com a infância, que se reflete no modo de narrar. “Há a questão da lenga-lenga, que precisamente não tem grandes justificativas psicológicas”, informa Gonçalo.
É curioso notar que as crianças aparecem na narrativa justamente após revolucionários destruírem, “quase por completo”, a Casa-das-Máquinas da história mundial, deixando apenas uma para que, a partir dela, recomecem. É quase como se, com isto, esses mesmo homens bagunçassem a história real do mundo. Sobre esse mecanismo, Gonçalo brinca: “Passa um pouco a ideia de que há uma máquina qualquer que está no subterrâneo e que faz movimentar a história sem nós nos apercebemos. E eventualmente pensamos que estamos nós a fazer a história, ou a contribuir, mas pegaram uma máquina qualquer que está a trabalhar e a fazer mudar as coisas para a esquerda ou para a direita, ou para a frente”.
A partir, e até antes disto, vamos tentando achar sentido no que é contado. A estrutura mítica passa a impressão de que cada elemento colocado no livro foi proposital. Porém, o autor adverte que é o contrário: “O simbolismo é quase uma linha direta. Esse tipo de coisa não me interessa de uma forma geral, nunca é uma coisa que está a simbolizar outra”, explica. Embora concorde que existem várias interpretações possíveis para a série mitológica, Gonçalo prefere ocultar as suas: “não tem nenhuma que seja mais consistente que a de qualquer leitor”. Mesmo assim, alguns personagens e situações são inevitáveis de se comparar quando pensamos na história recente mundial.
Por exemplo, nos parece clara a alusão do personagem Ber-lim com a divisão da cidade de mesmo nome por seu muro, durante a Guerra Fria. No livro, Ber-lim é retratado como um homem que ficou louco após entrar no Comboio, que andava numa velocidade extrema e o teria partido em dois. Outros episódios históricos também são narrados nos livros como se fossem lendas muito antigas, principalmente fatos que nos parecem espantosos até hoje, como a exibição do filme dos irmãos Lumière, a história do ex-guarda florestal Roy C. Sullivan — que foi atingido 7 vezes por relâmpagos, mas morreu suicidando-se — e Bryan Allen, um ciclista que conseguiu atravessar o Canal da Mancha usando um ciclo-avião movido a propulsão humana.
Para Gonçalo, nós estamos cada vez mais pobres dessas “histórias de espanto”, afirmação que também é a de Walter Benjamin, presente no final do primeiro livro da série. Segundo Benjamin, isso se deve a “nenhum acontecimento chegar até nós sem estar já impregnado de uma série de explicações”. E é justamente isso que Gonçalo tenta quebrar: “De repente, diante do espanto, temos que reagir de uma forma diferente, vamos nos revelar de uma maneira que nunca nos revelamos antes”, afirma.
Talvez, por tentar trabalhar tanto a ideia do assombro, é que Gonçalo acaba caindo também no território da loucura. Outra clara alusão à história é o personagem Dr. Charcot, inspirado em um médico do século 19, nascido na França, professor de Sigmund Freud e considerado um dos fundadores da neurologia. Para Gonçalo, esse personagem foi uma tentativa de contar a história da loucura. “Enquanto escritor, é interessante estudar um pouco os limites do ser humano. Nós temos o órgão mais íntimo do nosso corpo, que é o cérebro. De repente, [ele] dá-nos ordens, diz palavras que não queríamos dizer. Isso é absolutamente espantoso… É como uma espécie de avaria, mas não é uma máquina que avaria à nossa frente, é uma máquina que avaria dentro de nós”.
Ainda sobre a loucura, a dado momento surge a personagem Avestruz, que come cérebros. A descrição do ato no primeiro livro é talvez a cena mais repulsiva e curiosa: “A Avestruz, depois de conseguir o mais difícil, essa fenda ligeira no crânio, na parte de trás da cabeça, mergulha o bico, com aqueles movimentos ondulatórios do pescoço, num trabalho obcecado, de operatório, doentio, que revela um apetite, uma ambição animal, uma vontade que vem já do cheiro do interior da cabeça”. No entanto, ela muito se assemelha ao Dr. Charcot, que começa a fazer as chamadas lobotomias e fica tão “fascinado com a sua própria técnica de operar” que atua sobre uma pessoa sã. “O que interessa é pôr a máquina em funcionamento. Portanto há aqui também essa máquina de curar, que muitas vezes se tornou violenta”, informa o escritor.
Outras alusões não são tão claras, como o personagem Moscovo que igualmente teve sua principal máquina avariada após entrar no temido Comboio. Mas o que significa no livro o fato de uma cidade estar no hospício? Segundo Gonçalo, classificar alguém como louco era um dos métodos usados por Stalin — que morreu justamente na mesma cidade — para eliminar adversários políticos. Outros elementos podem ser interpretados de diversas formas, como a Mulher-Sem-Cabeça, cuja história abre as mitologias: “— Como a cortaram? — pergunta o Filho-Mais-Velho. / — Quem a cortou? — pergunta o Filho-do-Meio. / — Porquê? — pergunta o Filho-Mais-Novo. / A mãe responde: — Com um machado. Foi o pai. Porque queria ter mais espaço na cama”.
A personagem pode muito bem representar a violência masculina exercida sobre as mulheres, tocando em um debate atual. O fato de seu pescoço não parar de sangrar e os filhos procurarem-na enquanto limpam o sangue que caiu renderiam um ótimo terreno de análises para Clarissa Pinkola Estés, autora do clássico Mulheres que correm com os lobos. Embora claramente não fosse a intenção do autor, é nítida a existência de paralelos com temáticas de hoje em dia. Nesse aspecto, personagens como os Cem-Homens nos trazem reflexões sobre como tratamos as imigrações: “A fome é interrompida pelos estrangeiros que se recebem com hospitalidade e que depois são comidos. São os estrangeiros que matam a fome ao grupo da Caminhada-Muito-Extensa”.
Questionado sobre a falta de nomes nos outros personagens que não são alusões às figuras históricas, Gonçalo volta à temática do estrangeiro e explica que os seres mitológicos são aqueles que “aterram” no mundo, que o narrador não conhece. “A única forma de identificar é dizer: ‘olha o Homem-Com-a-Boca-Aberta’, que é um pouco como nós falamos quando não sabemos o nome e quando, às vezes, são personagens que nos assustam. Se a pessoa tem a boca aberta, de repente parece que não há mais nada, como se eu deixasse de ser uma pessoa e passasse a ser uma boca”, comenta.
Por fim, além das máquina e da loucura, outra questão muito atual e presente é a da velocidade. No segundo livro, os Homens-Com-a-Cabeça-Perto-do-Chão não conseguem fugir da “caminhoneta” porque estão trancados pela “enorme velocidade que o condutor impunha”, um grande paralelo aos judeus levados para os campos de concentração. A Velocidade é também “um dos orgulhos do “Homem-Mais-Alto que lidera a Revolução”: “Era a arma, substituía tanques, aviões bombardeiros, máquinas complexas”. Já em dado momento, o personagem Moscovo adverte a outro: “É um comboio perigoso (...) Dizem que põe as pessoas loucas, que as pessoas perdem o juízo, que umas ficam cegas, outras nunca mais conseguem ouvir música”.
Segundo Gonçalo, é como se existisse uma velocidade natural dos seres humanos e uma velocidade maior do que aquela que conseguimos entender. “Se temos essa velocidade é porque, de alguma maneira, estamos a arriscar ou a querer nos transformar em Deus. Acho que termos velocidade é nos aproximarmos da morte”. Ainda de acordo com ele a velocidade é inimiga da reflexão: “a filosofia é andar em círculos, cada vez mais fundo, mas sempre às voltas”, exemplifica citando o pensamento do filósofo Heidegger. Dessa forma, o escritor faz um alerta: estamos cada vez mais atraídos pela velocidade, como se ela fosse sempre positiva e a lentidão fosse o problema. “Voltar a valorizar o desvio me parece muito importante. Você fica com falta de reparar, que é um verbo muito bonito, porque é dar atenção, mas também tem o sentido de voltar a pôr em funcionamento. Eu acho que o século 21 está a ficar avariado, porque nós não reparamos nele, não estamos a ser suficientemente lentos”.
Que me pode dar a China que a minha alma me não tenha já dado? E, se a minha alma mo não pode dar, como mo dará a China, se é com a minha alma que verei a China, se a vir? Poderei ir buscar riqueza ao Oriente, mas não riqueza de alma, porque a riqueza de minha alma sou eu, e eu estou onde estou, sem Oriente ou com ele.
O que na Catedral de Reims é verdade não é a Catedral nem o Reims, mas a majestade religiosa dos edifícios consagrados ao conhecimento da profundeza da alma humana. O que nos calções dos zuavos é eterno é a ficção colorida dos trajes, linguagem humana, criando uma simplicidade social que é em seu modo uma nova nudez. O que nas pronúncias locais é universal é o timbre caseiro das vozes de gente que vive espontânea, a diversidade dos seres juntos, a sucessão multicolor das maneiras, as diferenças dos povos, e a vasta variedade das nações.
Transeuntes eternos por nós mesmos, não há paisagem senão o que somos. Nada possuímos, porque nem a nós possuímos. Nada temos porque nada somos. Que mãos estenderei para que universo? O universo não é meu: sou eu.
Romance em que a ficção é uma realidade cruel, baseado em quinhentas entrevistas "entre habitantes das aldeias da zona, bombeiros, soldados, sobreviventes, familiares e amigos dos que morreram".
Realidade: a 26 de Abril de 1986, o principal reator da central nuclear de Chernobyl, cidade localizada na fronteira da Ucrânia com a Bielorrússia, foi destruído por uma série de explosões.Das duas repúblicas da antiga União Soviética, foi a Bielorrússia que suportou os principais efeitos do maior desastre tecnológico do Século XX, apesar de a central não estar no seu território. A Rússia teve 0,5 por cento da sua área contaminada, a Ucrânia 4,8, enquanto a Bielorrússia ficou com 23 por cento do seu território contaminado com radionuclídeos de Césio-137. Em Gómel e Moguilev, localidades afetadas, a mortalidade ultrapassou a natalidade em 20%. A radiação espalhou-se. A 29 de Abril de 1986, foi registado um nível elevado de radiação na Polónia, Alemanha, Áustria e Roménia. No princípio de Maio, França, Bélgica, Holanda, Reino Unido, Israel, Kuwait e Turquia foram afectados. Substâncias gasosas viriam a espalhar-se pelo Japão, China, Índia, Estados Unidos e Canadá. As doenças oncológicas aumentaram. Antes de Chernobyl, havia 82 casos por cada 100 mil habitantes; depois de Chernobyl, os números são diferentes: 6 mil por cada 100 mil habitantes. O desastre de Chernobyl desencadeou uma tragédia social. Aldeias foram literalmente enterradas. Enterrava-se terra em terra. As casas foram fechadas, os animais abatidos ou abandonados, as terras cultivadas deixaram de poder ser usadas.
"Vi um homem assistir ao enterro da sua casa… [Levanta-se e vai à janela.] Ficou uma campa recém-cavada… Um rectângulo grande. Foi enterrado o poço, o jardim… [Silêncio.] Sepultávamos o solo… Cortávamo-lo em grandes camadas e enrolávamo-las…"
"Levanto-lhe o braço e o osso abana, dança, o tecido corporal desprendeu-se dele. Pedacinhos dos pulmões e do fígado saíam-lhe pela boca… Ele engasgava-se com as próprias vísceras… Eu embrulhava a mão numa gaze e metia-lhe na boca, tirava aquilo tudo...É impossível contá-lo! É impossível escrevê-lo!"
Liudmila Ignatenko - mulher do falecido bombeiro Vassíli Ignatenko
"Não sei do que hei de falar... Da morte ou do amor? Ou serão eles a mesma coisa...De qual deles devo falar? ...Éramos recém-casados.Ainda andávamos de mãos dadas, mesmo que fosse para ir apenas à loja. Sempre juntos. Eu dizia-lhe:«Amo-te.» Mas nessa altura não sabia o quanto. Não fazia ideia... Vivíamos na residência coletiva do quartel de bombeiros onde ele trabalhava. No primeiro andar. Havia três jovens casais, partilhávamos todos a cozinha. em baixo, no rés do chão, guardavam-se os veículos. Veículos vermelhos de combate ao fogo. Era esse o seu trabalho. Eu estava sempre a par da situação: onde ele se encontrava, o que lhe acontecia. Certa noite, ouvi um barulho. Gritos. Olhei pela janela lá para fora. eue viu-me. "Fecha os postigos e vai-te deitar. Há um incêndio na central. Já volto."Liudmila Ignatenko - mulher do falecido bombeiro Vassíli Ignatenko
"Se não há festa, a vida não presta… Uma ucraniana vende no mercado grandes maçãs vermelhas: «Quem quer maçãs? Maçãs de Chernobyl!» Alguém aconselha: «Ó mulher, não digas que são de Chernobyl, que ninguém tas compra.» «Não se preocupe! Então não compram! Há quem compre para a sogra, há quem compre para o chefe.»
Comprámos lenços pretos em Moscovo. Fomos recebidos pela Comissão Extraordinária. Disseram a todos nós a mesma coisa: É-nos impossível dar-vos os corpos dos vossos maridos, dos vossos filhos, estão em estado muito radioativo e vão ser enterrados num cemitério de Moscovo, de forma especial. Em urnas de zinco seladas, debaixo de lajes de cimento. E vocês têm de assinar este documento. É preciso o vosso consentimento. Se alguém se indignava e queria levar o caixão de volta para a terra natal, diziam-lhes que os mortos, como bem viam, eram agora heróis e já não pertenciam às suas famílias. Já eram figuras do Estado... Pertenciam ao Estado.
"Há muitos de nós aqui. Uma rua inteira, chamam-na assim mesmo: Chernóbylskaia. Estas pessoas trabalharam toda a vida na central. Muitas delas ainda vão para lá trabalhar, a central agora opera num sistema rotativo. Já ninguém vive naquele lugar, nunca vai viver. Têm doenças graves, diferentes graus de invalidez, mas não largam os empregos, têm medo sequer de pensar nisso. Não têm como viver sem o reactor, a sua vida é o reactor. Onde e quem precisará deles noutro lugar, agora? Morrem com frequência. Num instante. Morrem a andar: alguém caminha e cai, adormece e não acorda, leva flores à sua enfermeira e o coração para-lhe. Está numa paragem de autocarro... As pessoas morrem, mas ninguém lhes perguntou nada. Ninguém nos perguntou pelo que passámos. O que vimos... Ninguém quer ouvir falar da morte. Do que é assustador...
Mas eu falei-lhe do amor... Do quanto amei..."
Nicholas Rodney Drake- 19 de junho de 1948 - 25 de novembro de 1974
"O mundo, porém, não lhe prestou grande atenção — e não demorou muito até que ele o abandonasse aos 26 anos. Quem foi Nick e como chegou a 'Five Leaves Left', o álbum de estreia lançado há 50 anos?
Passaram-se 50 anos desde o primeiro álbum, 45 desde que morreu com apenas 26, mas ainda hoje ninguém consegue decifrá-lo. Matou-se com intenção ou teve uma overdose acidental? Pôr o público a ouvi-lo, como desejava, teria mudado o seu destino ou não faria grande diferença? O que é que lhe passava pela cabeça e o levava a atingir estados de depressão tais que até para família e amigos se tornava inacessível?
Eis a pergunta a que ainda ninguém conseguiu responder: quem foi Nick Drake? Há várias hipóteses de resposta. Opção 1: foi um homem nascido a 19 de junho de 1948 em Rangum, na Birmânia, filho de dois britânicos, mas que em criança se mudou em definitivo para o Reino Unido. Opção 2: foi um estudante da universidade de Cambridge que preferiu sempre a música às aulas. Opção 3: foi um guitarrista dotado, cantor frágil e leitor atento que escreveu poemas desencantados (de palavras económicas mas cuidadas) e os tornou canções — por vezes só com guitarra acústica, outras vezes com arranjos mais sinfónicos e elaborados, apropriando-se do blues, da folk e do jazz para canções que pedem tempo, isolamento, se possível até um refúgio campestre. Opção 4: uma súmula das três, a que acrescem as peças em falta de um puzzle que ninguém consegue completar.
A missão de o compreender tornou-se espinhosa desde cedo e os pais aperceberam-se disso. Da primeira escola que frequentou, os progenitores receberam relatórios do diretor a dizer que “nenhum de nós parecia conhecê-lo muito bem”, como recordou o pai, Rodney Drake, no breve documentário feito sobre a sua vida, “A Skin Too Few: The Days of Nick Drake”. Concluía Rodney: “Acho que [o diretor] estava correto. No que respeita ao Nick, as pessoas nunca o conheceram muito bem”."
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