"Pedro Taborda era um adolescente cuja família, a exemplo de muitas famílias portuguesas, tinha uma casa no Algarve e ali passava as suas férias de verão. Naquele agosto, hospedou-se na casa do lado uma família americana, com duas filhas. Como é natural, começaram a conviver e Pedro apaixonou-se por Laura, a mais velha das meninas americanas. As férias acabaram e cada família regressou a sua casa. Pedro e Laura corresponderam- se durante uns tempos, mas todos sabemos o que são amores de verão: a distância foi arrefecendo a relação. Pedro nunca esqueceu Laura, mas a vida continuou. Estudou jornalismo e, dez anos depois, foi para Nova Iorque estudar escrita criativa com um autor de que era admirador. Embora secretamente o desejasse, estava longe de saber que iria reencontrar o seu primeiro amor e se confrontaria com uma situação muito estranha: o pai de Laura foi encontrado morto com inúmeras facadas na casa de praia da família e a sua irmã na mesma sala com a arma do crime na mão.
Daqui nasce uma história, onde acontecem outros crimes, há pessoas com personalidades peculiares, situações aparentemente impossíveis, polícias de meios pequenos onde todos se conhecem e é difícil manter-se imparcial. Pedro apoia Laura na tentativa de descoberta da verdade, envolve-se emocionalmente no caso, mas tudo parece conjugar-se para tramar as meninas Walsh (era este o apelido da família), para as quais o caso não acaba bem. Pedro regressa a Portugal, a vida prossegue, casa, tem um filho, mas o que viveu naqueles dias é um espinho atravessado no seu caminho. Assim, com a anuência da esposa, uma década depois, decide aceitar o convite de um jornalista que quer fazer um documentário sobre o caso, e volta à América, para terminar o trabalho inacabado.
Como se vê, temos aqui uma história com todos os ingredientes para prender a atenção do leitor. Tem muitos outros pormenores, para além daqueles que apontei atrás, para a enriquecer, como os negócios obscuros do pai de Laura que nunca chegaremos a conhecer bem, o seu sócio muito estranho e as relações entre eles, que tanto aparentam ser de amizade como de ódio ou rivalidade, o relacionamento sui generis entre o casal e deste com as filhas, o colégio cheio de segredos onde ambas as meninas Walsh estudaram, sombras da juventude do Sr. Walsh que o velho cromo da aldeia e o seu neto meio anormal teimam em afirmar, mas ninguém leva a sério." Comentário de Sebastião Barata
Em tempo de reflexão...
14 de setembro de 2019...

Veja bem!
Nosso caso
É uma porta entreaberta
E eu busquei
A palavra mais certa
Vê se entende
O meu grito de alerta
Veja bem!
É o amor agitando o meu coração
Há um lado carente
Dizendo que sim
E essa vida dá gente
Gritando que não
"Leave the letter that never begins to go find the latter that ever comes to end, written in smoke and blurred by mist and signed of solitude, sealed at night."
"Suplico‑vos, meus irmãos! Permanecei fiéis a terra e não acrediteis naqueles que vos falam de esperanças extraterrestres! Envenenadores, eis o que eles são, quer o saibam, quer não.(...) Outrora , a ofensa a Deus era o maior ultraje, mas Deus morreu , e, com ele, morreram também esses sacrílegos. Agora, o que há de mais terrível é ultrajar a terra e dar mais apreço às entranhas do inescrutável do que ao sentido da terra."
Adoramos a perfeição, porque a não podemos ter; repugná-la-íamos se a tivéssemos. O perfeito é o desumano porque o humano é imperfeito.
O ódio surdo ao paraíso — o desejo como o da pobre infeliz de [que] houvesse campo no céu. Sim, não são os êxtases do abstracto, nem as maravilhas do absoluto que podem encantar uma alma que sente: são os lares e as encostas dos montes, as ilhas verdes nos mares azuis, os caminhos através de árvores e as largas horas de repouso nas quintas ancestrais, ainda que as nunca tenhamos. Se não houver terra no céu mais vale não haver céu. Seja então tudo o nada e acabe o romance que não tinha enredo.
Para poder obter a perfeição fora precisa uma frieza de fora do homem e não haveria então coração de homem com que amar a própria perfeição.
Pasmamos, adorando, da tensão para o perfeito dos grandes artistas. Amamos a sua aproximação do perfeito, porém o amamos porque é só aproximação.
É que a arte compõe-se de 3 elementos: 1) imitação, 2) vitalização; 3) (...)(Copia a arte a Natureza, e por Natureza aqui se entende tudo, desde os nossos íntimos pensamentos até às árvores e às pedras. Não procura a arte reproduzir, dar a nossa sensação simplesmente; mas dar da nossa sensação aquilo que mais traduza a realidade dela). A arte deve: 1) dar o objecto ou sentimento tal qual foi sentido; 2) vitalizá-lo para dar a impressão de realidade; 3) coordenar as fórmulas de vitalização empregadas. — A arte, como a ciência, supõe a eliminação do factor pessoal. Não viram isto os artistas modernos.A arte difere da ciência — não, como modernamente se crê, em que a Arte é subjectiva, e a ciência objectiva — mas em que a ciência procura interpretar e a arte criar.
Em tempo de infelicidade...
"(...) a obra explora marcas da decadência e rutura que desencadeiam a revolta. O próprio romance torna-se assim uma forma de revolução, silenciosa e implícita, tendo como pano de fundo as mudanças de uma família burguesa do Norte de Portugal. Fortemente simbólica, a narrativa acaba também por expor uma reflexão sobre a História mediante, sobretudo, a voz do narrador, quase sempre aforística e irónica. As Pessoas Felizes revela-se, por isso, um romance que prevê a mudança de pensamento, a alteração dos papéis sociais dos sexos e, em geral, as transformações sociais e morais que ocorreriam ao longo do último quartel do século XX."
«A protagonista deste romance, Nel, é uma mulher que não é feliz do mesmo modo que os outros, homens e mulheres, mas que quer ser feliz, para o que terá de deixar de ser aquilo a que estava destinada. Há qualquer coisa de premonitório neste romance. Pelos costumes das pessoas, pelos sentimentos, pelas relações entre parentes e familiares, percebe-se que já muita coisa mudou ou está em mudança antes mesmo de a revolução acontecer. A revolução, aliás, é o coroar de um processo de mudança, mais do que o seu começo. Em algo de essencial, de fundamental, isto é, nos sentimentos, as coisas já eram diferentes antes de 1974.» [Do Prefácio de António Barreto]
Em tempo de homens maus...
Excertos de uma entrevista, a propósito da publicação de Homens Bons:
"Sinto que o mundo já viveu a sua melhor época, essa esperança que resultou na Revolução Francesa e foi até ao estalinismo. O comunismo e o socialismo ainda faziam parte dessa grande esperança no futuro... Até que a puta condição humana acabou por perverter tudo. Estaline é o fim de um sonho. Matou mais gente do que Hitler, mas o mau de Estaline não foi só ser um grande tirano: ele esmagou o sonho de mudança, com ele morreu a esperança de seres humanos que acreditavam que podiam construir um mundo melhor. Entre o fim do século XVIII e meados do século XX viveu-se o período mais luminoso. Que não vai voltar(...) vêm aí os bárbaros outra vez.(...) Eu sabia, outros sabiam, mas muita gente falava só de um mundo ideal, dos direitos humanos universais, de ser solidário...(...)É uma cultura de facilidade. Temos medo de traumatizar os meninos com a Ilíada, ou com a História... O objetivo principal passou a ser não haver insucesso escolar, e nivela-se tudo muito por baixo. Os sistemas de educação no mundo ocidental, hoje, são feitos para normalizar e desprezam os mais inteligentes.(...)
Agora a revolução anuncia-se vinda dos mais brutos, dos que mostram degolações no Twitter, de verdadeiras bestas sem nenhuma dimensão intelectual. Agora é o poder do rancor, da vingança, que dirige essas ações. (...) Mas não há ideologia. Vão arder bibliotecas, palácios, parlamentos. Isso é terrível..(...)É uma mediocridade enorme, já nem quero saber das notícias. Estou cansado. Tenho a minha biblioteca, que é o meu bunker, a minha trincheira, o meu refúgio. Ponho-me a ler Sócrates, Xenofonte, Montaigne, Plutarco... Como uma aspirina que tira as dores de cabeça...."
Em tempo de separação, em tempo de "pardais", um livro para os tristes...
Os tristes o poder em ler, mas ai não os ouve mais, depois que nas mulheres ouve piedade. Nas mulheres, sim, porque sempre nos homens ouve desamor. Mas para elas não o faço eu; que pois que o seu mal é tamanho, que se não pode confortar com outro nenhum...
Meu amigo verdadeiro, quem me vos levou tão longe? Que vos comigo e eu convosco, sós, só íamos passar nossos nojos grandes, e tão pequenos para os de depois! A vos contava eu tudo. Como vos fostes, tudo se tornou tristeza; nem parece ainda senão que estava espreitando já que vos fosses...
Não tardou muito que, estando eu assi cuidando, sobre um verde ramo que por cima da água se estendia, se veio aposentar um rouxinol; e começou tão docemente cantar que de todo me levou após si o meu sentido de ouvir.E ele cada vez crescia mais em seus queixumes, cada ora parecia que como cansado queria acabar, senão quando tornava como que começava então. A triste da avezinha que estando-se assi queixando, não sei como, caio morta sobre a água, e caindo por entre as ramas, muitas folhas caíram também com ela.
Em tempo de recordar...
Poderei igualar-te a um dia de verão?
És mais ameno e brando, e muito mais gentil.
Vacila ao vento rude o rebento em botão
E a vida do Verão, demasiado breve.
Queimando muita vez, o olho do céu brilha,
Muita vez sua face dourada se embacia;
E sempre o que é mais belo da beleza declina
Ao mando do destino ou natural porfia.
Mas não definhará o teu eterno Verão,
Nem a tua beleza há-de deixar de ser,
Nem a Morte dirá que em sua sombra és,
Quando, em eternos versos, no tempo tu cresceres.
Enquanto alento houver e houver humano olhar,
Hão de viver meus versos, e tu neles viver.
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