Não é que tenhamos uma reserva a priori relativamente a tudo o que brilha, mas, a um brilho superficiail e gelado, preferimos sempre os reflexos profundos, um pouco velados...
A minha intenção ao escrever isto era a de colocar a questão de saber se ...nas letras e nas artes não subsistiria alguma maneira de compensar os estragos. Quanto a mim, gostaria de fazer reviver , pelo menos no domínio da literatura, esse universo de sombra que estamos prestes a dissipar.
Via muito bem como os mercadores faziam negócios, como os potentados iam à caça, os enlutados choravam seus mortos, as meretrizes se ofereciam, os médicos cuidavam de seus pacientes, os sacerdotes fixavam o dia apropriado para a semeadura, os namorados enlaçavam-se, as mães amamentavam os filhinhos... Mas nada disso era digno de ser olhado. Tudo era mentira..
A ampla fachada principal do castelo era feita de pedra clara e suas grandes janelas davam para o Reno e os canaviais, e além para uma paisagem aberta e brilhante de água, juncos e relva onde, mais longe, as montanhas arqueadas de azul as florestas formaram uma curva suave que seguiu o deslocamento das nuvens; Somente quando o Foehn, o vento sul, soprou, os castelos e casas de fazenda brilharam, minúsculos prédios brancos à distância. A fachada do castelo refletia-se no riacho calmo, alegre e frívolo como uma menina; os arbustos do parque deixavam seus galhos verde. "Jogo de Sombras"
Na penumbra da casa, ao sol da beira -rio, junto dos barcos, e à sombra do bosque amarelado e da figueira, nasceu Siddhartha, o belo filho do brâmane...
O filho permaneceu silencioso e imóvel,de braços cruzados. O pai, silencioso e imóvel, continuou sentado na esteira. E as estrelas iam passando no céu.
Via muito bem como os mercadores faziam negócios, como os potentados iam à caça, os enlutados choravam seus mortos, as meretrizes se ofereciam, os médicos cuidavam de seus pacientes, os sacerdotes fixavam o dia apropriado para a semeadura, os namorados enlaçavam-se, as mães amamentavam os filhinhos... Mas nada disso era digno de ser olhado. Tudo era mentira..
Havia um certo homem que exercia a profissão bem pouco considerada de novelista, mas que, no entanto, pertencia àquele grupo de literatos que fazem todos os possíveis por a levar a sério e aos quais, alguns entusiastas, concediam uma veneração semelhante àquela que em tempos, quando ainda havia poesia e poetas, costumava conceder-se aos verdadeiros artistas. Este literato escrevia muitas coisas bonitas: escrevia romances, contos e ainda poesia, e dava-se ao inimaginável trabalho de o fazer bem feito. Todavia, raramente conseguia corresponder às suas aspirações, pois tomando-se embora por uma pessoa modesta cometia o erro de, arrogantemente, não se confrontar com os seus colegas e contemporâneos, seguindo-lhes o exemplo, mas sim com os poetas dos tempos antigos, aquele, portanto, que se haviam afirmado ao longo de diversas gerações. Então, para seu próprio desgosto, tinha de reconhecer sempre de novo que, mesmo a sua melhor página, a mais perfeita, se achava bem distante da frase ou do verso mais esquecido daqueles verdadeiros poetas. E, assim, ele foi-se tornando sempre mais descontente (…)
Durante todo o dia, o literato manteve-se ocupado com o seu sonho e, quanto mais profundamente se embrenhava nele, mais belo lhe parecia, mais lhe parecia superar todos os poemas dos melhores poetas. Longo tempo, e por vários dias, ele perseguiu o desejo e os projectos para narrar este sonho, de tal modo que não só para ele que o sonhara, mas também para os outros, possuísse esta beleza inqualificável e esta mesma profundidade e interioridade. Somente muito mais tarde ele abdicou destes desejos e tentativas, e viu que teria de concentrar-se por ser um verdadeiro poeta, um sonhador, um visionário na sua alma e que a sua obra manual, todavia, teria de permanecer a de um simples literato. "Andanças de um Sonho"
Sem comentários:
Enviar um comentário