Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

segunda-feira, 22 de maio de 2017

Promessas, deveres e obrigações...

Somos ocos não só por dentro, senão também por fora, párias da antecipação e da promessa.

Das pequenas vozes com que a manhã acorda,
Da fútil promessa do dia,
Morta ao nascer, na esperança longínqua e absurda
Em que a alma se fia.

Eu, pecadora, me confesso de, neste dia, ter dirigido o meu olhar para as folhas do objeto que se segue: Mea culpa, mea maxima culpa.Juro a imperiosa necessidade que a tal sacrilégio me impeliu e prometo que tal não voltará a acontecer...

Pedro chagas freitas prometeu falhar e falhou . Percorri , durante uma hora, por obrigação profissional, as 390 páginas( nem imaginação teve para conseguir chegar às 400) que constituem esta coisa inclassificável que , despudoramente, é considerada um romance.O que dizer da preocupação de originalidade, pretensiosa e desconchavada, que mistura o tema central do amor com vestígios de preocupações sociais de uma menoridade que toca a indigência mental?"Moro num país em que a pobreza não é crime."
O narrador usa e abusa de antíteses elementares que pretendem traduzir paradoxos que ofendem a racionalidade do leitor. O falhanço, anunciado no título, foi conseguido, entre outros motivos, por ter concebido a obra com uma espécie de catálogo de modos de expressão e de géneros literários: poemas; crónicas tipo Correio da Manhã; cartas; fragmentos dispersos com que, desesperadamente, tenta imitar GMT; inestética mistura de uso da letra maiúscula/ minúscula que até visualmente tem o seu quê de pornográfico; um indigente nível vocabular em que " foda-se" e "filho da puta" surgem , página sim página não, detetáveis só pelo simples facto de se folhear o livro; uma obsessão de parecer não convencional que torna os diálogos similares a conversas dos programas da teresa guilherme, com uma insistência exibicionista na palavra " orgasmo", usada de modo abusivo e até descontextualizado; um esforço de rebeldia literária manifestado pelo facto de não respeitar o acordo ortográfico e por inúmeras frases de sensualidade inebriante, de que registo um elucidativo exemplo: "Sempre que te leio tenho de estar toda nua."
A única dúvida é se a leitura me causou repulsa,repugnância ou nojo: ele e os editores; ele e todos os seus leitores; ele e as tolas das admiradoras; ele e o mundo que o pariu...Não há pensamento, não há reflexão, há palavras, palavras corriqueiras, frases repetidas e repetitivas, que tornam esta obra uma espécie de bíblia para utilizadores acéfalos de redes sociais...
Como é que um professor permite que esta literatura seja objeto de "contrato de leitura" , uma ideia meritória dos programas de português? Não encontro resposta ou, melhor, prefiro não a encontrar... Será porque o autor gosta de gatos e este afeto é, atualmente, quase tãofashion como apreciar gin?
Pelas críticas que li , ele vende muito no brasil, país onde tem muitas admiradoras... Dentro da lógica amorosa da obra, imaginei que o pedro e a matilde fariam um belo par, pois ela " é toda boa" e "foda-se, ele é tão bom"...

Só me ocorre parafrasear almada negreiros: morra o pedro chagas freitas, morra. PIM...

Vou-me purificar, sinto-me conspurcada pela minha cobardia...



Releio lúcido, demoradamente, trecho a trecho, tudo quanto tenho escrito. E acho que tudo é nulo e mais valera que eu o não houvesse feito. As coisas conseguidas, sejam impérios ou frases, têm, porque se conseguiram, aquela pior parte das coisas reais, que é o sabermos que são perecíveis. Não é isto, porém, que sinto e me dói no que fiz, nestes lentos momentos em que o releio. O que me dói é que não valeu a pena fazê-lo, e que o tempo que perdi no que fiz o não ganhei senão na ilusão, agora desfeita, de ter valido a pena fazê-lo. Tudo quanto buscamos, buscamo-lo por uma ambição, mas essa ambição ou não se atinge, e somos pobres, ou julgamos que a atingimos, e somos loucos ricos. O que me dói é que o melhor é mau, e que outro, se o houvesse, e que eu sonho, o haveria feito melhor. Tudo quanto fazemos, na arte ou na vida, é a cópia imperfeita do que pensámos em fazer. Desdiz não só da perfeição externa, senão da perfeição interna; falha não só à regra do que deveria ser, senão à regra do que julgávamos que poderia ser. Somos ocos não só por dentro, senão também por fora, párias da antecipação e da promessa. Com que vigor da alma sozinha fiz página sobre página reclusa, vivendo sílaba a sílaba a magia falsa, não do que escrevia, mas do que supunha que escrevia! Com que encantamento de bruxedo irónico me julguei poeta da minha prosa, no momento alado em que ela me nascia, mais rápida que os movimentos da pena, como um desforço falaz aos insultos da vida! E afinal, hoje, relendo, vejo rebentar meus bonecos, sair-lhes a palha pelos rasgos, despejarem-se sem ter sido...

Tenho sonhado muito. Estou cansado de ter sonhado, porém não cansado de sonhar. De sonhar ninguém se cansa, porque sonhar é esquecer, e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos. Em sonhos consegui tudo. Também tenho despertado, mas que importa? Quantos Césares fui! E os gloriosos, que mesquinhos! César, salvo da morte pela generosidade de um pirata, manda crucificar esse pirata logo que, procurando-o bem, o consegue prender. Napoleão, fazendo seu testamento em Santa Helena, deixa um legado a um facínora que tentara assinar a Wellington. Ó grandezas iguais às da alma da vizinha vesga! Ó grandes homens da cozinheira de outro mundo! Quantos Césares fui, e sonho todavia ser.Quantos Césares fui, mas não dos reais. Fui verdadeiramente imperial enquanto sonhei, e por isso nunca fui nada. Os meus exércitos foram derrotados, mas a derrota foi fofa, e ninguém morreu. Não perdi bandeiras. Não sonhei até ao ponto do exército, onde elas aparecessem ao meu olhar em cujo sonho há esquina. Quantos Césares fui, aqui mesmo, na Rua dos Douradores. E os Césares que fui vivem ainda na minha imaginação; mas os Césares que foram estão mortos, e a Rua dos Douradores, isto é, a Realidade, não os pode conhecer.
Atiro com a caixa de fósforos, que está vazia, para o abismo que a rua é para além do parapeito da minha janela alta sem sacada. Ergo-me na cadeira e escuto. Nitidamente, como se significasse qualquer coisa, a caixa de fósforos vazia soa na rua que [se] me declara deserta. Não há mais som nenhum, salvo os da cidade inteira. Sim, os da cidade dum domingo inteiro — tantos, sem se entenderem, e todos certos.
Quão pouco, no mundo real, forma o suporte das melhores meditações. O ter chegado tarde para almoçar, o terem-se acabado os fósforos, o ter eu atirado, individualmente, a caixa para a rua, mal-disposto por ter comido fora de horas, ser domingo a promessa aérea de um poente mau, o não ser ninguém no mundo, e toda a metafísica.
Mas quantos Césares fui!


Peça escrita em 1957, representada pela companhia do Teatro Experimental do Porto, com encenação de antónio pedro, foi em seguida proibida... A peça relata o drama de um jovem casal prisioneiro de uma promessa, da qual não se pode liberta... A libertação surge, no final do drama, quando a pressão social e a própria natureza humana é superior à força da religião supersticiosa.

SALVADOR- Porque não falas tu com o padre, Zé? Ele muda-te a promessa... verás!...
JOSÉ - Não, pai. Prometi: cumpro.
SALVADOR ( Indicando Maria do Mar. )E ela?...
JOSÉ - Também prometeu. E há-de cumprir.
SALVADOR - Para quê, para que prometeram vocês uma coisa dessas?! Melhor fora que o mar me tivesse engolido a mim, naquela noite medonha! Melhor fora, me­lhor fora, Zé! Eu já não presto, não sirvo para nada...


Will I always be there for you When you need someone? Will I be that one you need? Will I do all my best to, to protect you? I promise, I promise, I promise I will, oh yeah And I promise And I promise I will be there when you call me I promise,I promise...



A pior sensação possível é pensar ( intuir, deduzir, conjeturar, imaginar...) que sou um dever, uma obrigação , e não um prazer. Onde não sou o primeiro, prefiro não ser nada, não estar lá, Onde não posso agir o primeiro, prefiro só ver agir os outros. Onde não posso mandar, antes quero nem obedecer.

Flores amo, não busco. Se aparecem
Me agrado ledo, que há em buscar prazeres
O desprazer da busca.
A vida seja como o sol, que é dado,
Nem arranquemos flores, que, arrancadas
Não são nossas, mas mortas.


(Falta uma citação de Séneca)

Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto é melhor, quanto há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!


Nada como uma noite de insónias para ultimar obrigações literárias...O cumprimento do dever preenche o vazio de esperar que o tempo passe... O tempo dedicado à literatura infanto - juvenil não é perdido porque já o o era.

O ter deveres, que prolixa coisa!
Agora tenho eu que estar à uma menos cinco
Na Estação do Rossio, tabuleiro superior — despedida
Do amigo que vai no «Sud Express» de toda a gente
Para onde toda a gente vai, a Paris...
Tenho que lá estar
E acreditem, o cansaço antecipado é tão grande
Que, se o «Sud Express» soubesse, descarrilava...
Brincadeira de crianças?
Não, descarrilava a valer...
Que leve a minha vida dentro, arre, quando descarrile!...
Tenho desejo forte,
E o meu desejo, porque é forte, entra na substância do mundo.


Custa-me um chumbo dos sentidos o mover-me com os pés para onde moro. A carícia do apagamento, a flor dado do inútil, o meu nome nunca pronunciado, o meu desassossego entre margens, o privilégio de deveres cedidos, e, na última curva do parque avoengo o outro sonho como um roseiral. Alastra ante meus olhos saudosos a cidade incerta e silente. (...) Que noite! Prouvera a quem causou os pormenores do mundo que não houvesse para mim melhor estado ou melodia que o momento lunar destacado em que me desconheço conhecido.
Durmo, e nem brisa, nem gente interrompe o que não penso. Tenho sono do mesmo modo que tenho vida. Só que sinto nas pálpebras, como se houvesse o que fazer-mas pesar. Ouço a minha respiração.


Meditei hoje, num intervalo de sentir, na forma de prosa de que uso. Em verdade, como escrevo? Tive, como muitos têm tido, a vontade pervertida de querer ter um sistema e uma norma. É certo que escrevi antes da norma e do sistema; nisso, porém, não sou diferente dos outros.Analisando-me à tarde, descubro que o meu sistema de estilo assenta em dois princípios, e imediatamente, e à boa maneira dos bons clássicos, erijo esses dois princípios em fundamentos gerais de todo estilo: dizer o que se sente exactamente como se sente — claramente, se é claro; obscuramente, se é obscuro; confusamente, se é confuso —; compreender que a gramática é um instrumento, e não uma lei. Suponhamos que vejo diante de nós uma rapariga de modos masculinos. Um ente humano vulgar dirá dela, «Aquela rapariga parece um rapaz». Um outro ente humano vulgar, já mais próximo da consciência de que falar é dizer, dirá dela, «Aquela rapariga é um rapaz». Outro ainda, realmente consciente dos deveres da expressão, mas mais animado do afecto pela concisão, que é a luxúria do pensamento, dirá dela, «Aquele rapaz». Eu direi, «Aquela rapaz», violando a mais elementar das regras da gramática, que manda que haja concordância de género, como de número, entre a voz substantiva e a adjectiva. E terei dito bem; terei falado em absoluto, fotograficamente, fora da chateza, da norma, e da quotidianidade. Não terei falado: terei dito.(...) Obedeça à gramática quem não sabe pensar o que sente. Sirva-se dela quem sabe mandar nas suas expressões. Conta-se de Sigismundo, Rei de Roma, que tendo, num discurso público, cometido um erro de gramática, respondeu a quem dele lhe falou, «Sou Rei de Roma, e acima da gramática». E a história narra que ficou sendo conhecido nela como Sigismundo «super-grammaticam». Maravilhoso símbolo! Cada homem que sabe dizer o que diz é, em seu modo, Rei de Roma. O título não é mau, e a alma é ser-se.

No dia triste o meu coração mais triste que o dia...
Obrigações morais e civis?
Complexidade de deveres, de consequências?
Não, nada...
O dia triste, a pouca vontade para tudo...
Nada...
Outros viajam (também viajei), outros estão ao sol
(Também estive ao sol, ou supus que estive),
Todos têm razão, ou vida, ou ignorância simétrica,
Vaidade, alegria e sociabilidade(...)
No dia triste o meu coração mais triste que o dia...
No dia triste todos os dias...
No dia tão triste...


A história é contada, em finais do primeiro quartel do século XVI, pelo físico e astrólogo Mestre João, que regressa, velho e doente, a Portugal, depois de muitos anos no Oriente, e que, à passagem do Cabo da Boa Esperança, recorda os acontecimentos de que fora, aí, testemunha muitos anos antes.A ação narrada por Mestre João passa-se no mar, em 1501, no interior de uma nau da frota de Pedro Álvares Cabral, que o mesmo Mestre João acompanhara na sua viagem, primeiro, ao Brasil e, depois, pela rota de Vasco da Gama à Índia. Regressando à Índia, a nau recolhera então na Angra de S. Brás, perto do Cabo da Boa Esperança, onde fazia aguada, um náufrago (Manuel) que contou uma história fantástica e terrível.

Uma peça de teatro confusa, de uma complexidade aberrante para alunos de 8º ano, com uma estrutura dramática atípica, que se lê com bastante penosidade. Não respeita o acordo ortográfico , o que, pessoalmente, não me afeta, mas, senhor ministro da educação, não lhe parece bizarro ter de dizer a alunos daquela idade: " Se escreveres assim, tens erro ..."


Aqui se conta a rebeldia de um caracol que queria ter nome e não percebia a razão por que era tão lento. Pediu ajuda ao mocho de olhos fechados. "Abro-os à noite e vejo tudo o que há; durante o dia fecho-os e assim vejo tudo o que houve." Disse-lhe a ave que era lento porque carregava um grande peso. Ela própria carregava lembranças que a impediam de voar. O caracol não se convenceu e seguiu viagem. Lentamente, muito lentamente.Seria um outro animal de igual lentidão, a tartaruga, que lhe daria as respostas certas e as perguntas que lhe faltavam. Foi também ela, que se chamava Memória, que baptizou o caracol com o nome Rebelde.O caracol há-de voltar a casa, o País do Dente-de-Leão, mais sábio e corajoso. Com ele, os companheiros vão saber finalmente o que é a liberdade. Mas devagarinho. Sem pressa.

Impossível não pensar no elogio da lentidão feito por GMT, como resposta à seguinte pergunta:" O que de mais preocupante a velocidade nos tira?"

A velocidade é uma forma mansa de violência, mas não deixa de ser uma violência. Acima de uma certa velocidade deixamos de ver o que está lá fora, deixamos de ver por completo, cegamos. Mesmo em termos políticos.
Escrevi uma vez que a democracia é o reino da lentidão. E ainda bem, acrescento. Por vezes, a lentidão da democracia irrita-nos, claro. O tempo que demora uma lei a ser mudada, a ser cumprida. Mas essa é a parte natural da democracia, a precaução, uma certa sensatez que resulta da discussão. O diálogo nunca é rápido, atrasa sempre. Dialogar não é decidir, é adiar a decisão. Adiar a decisão para encontrar lá à frente aquilo que se acredita ser a melhor decisão. Por isso tenho muito medo quando as democracias aceleram os processos, entrando numa velocidade estonteante. Devemos desconfiar sempre de uma democracia que aprova novas leis a grande velocidade. É um sinal perigoso. A lei – Aristóteles falava disso – só é lei se é justa e se dura no tempo. Porque se é justa, dura no tempo. Se não dura no tempo, não é justa. Quando rapidamente se troca uma lei por outra e depois por outra, estamos, sem o saber, no campo da dissolução da democracia. Acima de uma determinada velocidade, a democracia corre perigo. Podemos não gostar da ideia de lentidão, mas é assim mesmo. A democracia exige lentidão mínima.



Esta é a história de Zorbas, uma gato grande, preto e gordo. Um dia, uma formosa gaivota, apanhada por uma maré negra de petróleo deixa ao cuidado dele, momentos antes de morrer, o ovo que acabara de pôr. Zorbas, que é um gato de palavra, cumprirá as duas promessas que nesse momento dramático lhe é obrigado a fazer: não só criará a pequena gaivota, como também a ensinará a voar. Tudo
isto com a ajuda dos seus amigos Secretário, Sabetudo, Barlavento e Colonello, dado que, como se verá, a tarefa não é fácil, sobretudo para um bando de gatos mais habituados a fazer frente à vida dura de um porto como o de Hamburgo do que a fazer de pais de uma cria de gaivota… O destino encarrega-se de juntar dois seres completamente distintos que, por causa de uma promessa, constroem uma bela amizade.


Histórias para crianças: bonitas, educativas, bem escritas, muito bem ilustradas,num papel acariciante e com a conveniente brevidade. Mas...são mesmo histórias para crianças e eu já não sou criança.

A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou
A vinda tem a regressão errada.
Já não sei de onde vim nem onde estou.
De o não saber, minha alma está parada.

Se ao menos atingir neste lugar
Um alto monte, de onde possa enfim
O que esqueci, olhando-o, relembrar,

Na ausência, ao menos, saberei de mim,
E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
Em mim um pouco de quando era assim.


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