Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Mosteiros e frades...


No dia 9 de dezembro de 1854, morreu Almeida Garrett que, apesar de liberal, escreveu uma reflexão bem atual neste tempo de "barões desgraciosos"...

No ponto de vista artístico porém o frade faz muita falta.(...) Nos campos ... eles caracterizavam a paisagem, poetizavam a situação mais prosaica de monte ou de vale; e tão necessárias, tão obrigadas figuras eram em muito desses quadros, que sem elas o painel não é já o mesmo. Além disso o convento no povoado e o mosteiro no ermo animavam, amenizavam, davam alma e grandeza a tudo; eles protegiam as árvores, santificavam as fontes, enchiam a terra de poesia e de solenidade. O que não sabem nem podem fazer os agiotas barões que os substituíram. É muito mais poético o frade que o barão. O frade era, até certo ponto, o Dom Quixote da sociedade velha. O barão é, em quase todos os pontos, o Sancho Pança da sociedade nova. Menos na graça... Porque o barão é o mais desgracioso e estúpido animal da criação. 

 Experimento, por vezes, uma estranha nostalgia de mosteiros, como centros da vida espiritual, habitados por monges, seres que escolheram a reclusão, o isolamento, o silêncio, a ascese como forma de vida. Com a expulsão das ordens religiosas, que considero um crime histórico, os mosteiros, por mais belos que sejam, ficaram só pedras, mais ou menos artísticas, tristemente solitárias e incompletas, porque privadas de alma. Sempre que entro no Mosteiro de Alcobaça, invade-me uma enorme tristeza...tenho saudades do espaço-tempo-ideia-vivência que nunca conheci.

 Cruz na porta da tabacaria! 
Quem morreu? O próprio Alves?
 Dou Ao diabo o bem-estar que trazia. 
Desde ontem a cidade mudou. 

 Quem era? Ora, era quem eu via.
 Todos os dias o via. Estou 
Agora sem essa monotonia. 
Desde ontem a cidade mudou.

 Ele era o dono da tabacaria. 
Um ponto de referência de quem sou 
Eu passava ali de noite e de dia. 
Desde ontem a cidade mudou. 

 Meu coração tem pouca alegria, 
E isto diz que é morte aquilo onde estou. 
Horror fechado da tabacaria! 
Desde ontem a cidade mudou. 

 Mas ao menos a ele alguém o via, 
Ele era fixo, eu, o que vou, 
Se morrer, não falto, e ninguém diria. 
Desde ontem a cidade mudou.

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