Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Amores e desamores...

Amar é ter medo, um medo enorme, mesmo inconfessado, de perder… Amar é ter medo de desiludir, de desencantar… é ter medo de que o fascínio termine … Amar é um estado de medo permanente… Amar é sentir raiva quando se fica sozinho… 

 A vida é absurda, uma absurda comédia que nem romântica chega a ser... Mais do que uma impossibilidade, os meus devaneios são uma possibilidade absolutamente improvável. Entendidas todas as subtis e indiretas advertências, resolvi assumir, exteriormente, uma postura que demonstre respeito por mim mesma... Quando a ideia de ti me começa a impedir o sono, não vale a pena tentar dormir... Há momentos em que me sinto "não eu", o que é diferente de não sentir nada. O sentimento de negatividade é muito mais doloroso do que o vazio afetivo. Impenso-te… Tu estás, tu és.. Ser e estar identificam-se? Até que ponto o acidental do estar penetra a essência do ser? Estar frequentemente incorpora-se de tal modo que o ser se identifica com o estar. É isso que me angustia, recear que uma fase , um estar episódico , compreensível e circunstanciado, se revele, afinal, uma característica essencial que se encontrava adormecida e despertou, passando a ser um traço permanente...O estar deixou de coincidir com o ser? O ser passou a identificar-se com o estar? O estar social invadiu o reino mágico do ser individual , destruindo-o... Para sempre? O eu outrou-se no ser plasmado em meia dúzia de retratos esteriotipados? Não podemos navegar numa palavra. Não podemos ir embora. Falar é ficar. Se falo é porque ainda não fui. Ainda aqui estou. Preciso de me calar...Preciso de aprender a calar-me. Não sentir nada, sentir o vazio, é um estado que me é familiar...não me sentir eu está a ser mais complexo.

     A partir de então e até à sua morte, Molly Morgan Muir esperou com ilusão e impaciência a chegada do dia escolhido em que o seu imaterial amor silencioso aceitava regressar ao passado do seu tempo em que na realidade já não havia qualquer passado ou tempo, a chegada de cada quarta-feira. E pensa-se que talvez tenha sido isso que a manteve ainda viva durante bastantes anos, ou seja, com passado e presente e também futuro, ou talvez tudo isso sejam nostalgias.

    "Em Não mais amores, aparece um Elvis Presley, mas também a sombra de um fantasma; uma atriz porno iniciante que está prestes a conhecer o seu parceiro de filmagens e um mordomo antiquado em Nova Iorque; um assassino por encomenda que tenta dissuadir quem o quer contratar, mesmo que isso lhe implique o soldo, e a desgraça de um casal de mafiosos; um escritor anacrónico, e talvez sem talento, tão viciado na sua dor que abandona a medicação que a apaga para investigar o seu efeito na existência, e um homem que encontra outro homem igual a si e que tenta fugir da semelhança, em simultâneo com o outro, mantendo-a. 

 A condição humana refulge nesse homem que enfrenta o seu duplo, estando Javier Marías a refazer o cenário já experimentado por autores como Saramago (O Homem Duplicado) ou Dostoievski (O duplo). Mesmo num mundo em que se procura a unidade, a ausência de individualidade atinge e transtorna, daí os esforços para a distância e para a diferença, mesmo que isso implique o colapso profissional, pessoal ou mental. 

 Noutro conto, a fotografia é um vício que prova o amor: pode amar-se sem uma máquina fotográfica, sem o desejo obtuso de se cristalizar a imagem da coisa amada? Uma das personagens responde: “Você adora a sua mulher? Não me faça rir. Você nem sequer tem uma câmara. Não a quer recordar verdadeiramente, tal como foi, se a perder. Não quer voltar a vê-la quando já não a puder ver.” 

  E então atinge-se a inquietação a la Marías: um cenário à partida idílico que leva com a sombra, e o tormento, da sua efemeridade. Pelo meio, um amor louco, e louco no sentido de doentio: o homem que amava a mulher desde antes de ser mulher, que esperou por ela como um estóico, ou um obcecado, que viveu o seu tempo e o tempo dela em simultâneo, que contrapôs às décadas que os separavam um afluir de referências, e uma “adoração imutável” que, mais do que arcabouço cardíaco, é um perigo iminente: o homem sabe que acabará por matá-la. Marías enfrenta ainda os despojos que a vida de alguém deixa quando já deixou de ser vida: os espaços maculados pela ausência, a tristeza de tudo continuar igual quando alguém já não existe, a afronta ao ego que é a irrevogável passagem do tempo e a regeneração da vida, o reaproveitamento de espaços e esses espaços como depositários do tempo. 

 Os contos são não apenas hipóteses de situações ou de vida, mas confrontos morais permanentes. Não há situação em que não se sinta a angústia de uma decisão, e é isso que o leitor encara, tentando formular uma hipótese ao mesmo tempo que é engolido no drama das personagens. Assim sendo, fica claro que a inquietação de Marías é dos maiores tesouros da literatura contemporânea."

Quando o  conheci, era um jovem cândido e puro, apesar de uma maturidade rara e de uma inteligência superior. O tempo, inevitavelmente, maculou essa encantadora combinação de ingenuidade com lucidez. Estranha e paradoxalmente, ela  passou a ser a criança e o afastamento foi inevitável. Viviam em mundos diferentes...

Uma sátira irreverente da poesia de Pessoa, dizem alguns.
Uma sátira dos adoradores de Pessoa, dizem outros. 
Uma tentativa de ridicularizar a dimensão espiritual e o drama da fragmentação de Pessoa . Uma mera tentativa, de uma intelectualice demasiado brejeira, digo eu. 
 ( Estava certa de que não iria gostar, mas assim já posso dizer mal com conhecimento de causa...)

  Ela canta, pobre ceifeira,
  Julgando-se feliz, talvez.
  Canta, e roussa. E a sua voz, cheia
  De alegre e anónima liquidez 

  É branca como um grito de ave 
  Num ferro de Alcácer-Kibir,
  E há résteas de luz e de adarve 
 No som que ela faz a se vir. 

 Ouvi-la, alegra e aborrece. 
 na sua voz há recidiva. 
 E roussa como se tivesse 
 Mais fodas a dar do que a vida.

 Ah! Poder ser tu sendo eu! 
 T er a tua alegre limalha
 E todo o ouro dela! Ó céu Ó campo, ó canção, 

 O homem pesa tanto e a matriz é tão leve! 
Entrai por mim dentro! 
Tornai Meu anus o vosso almocreve! 
Depois, levando-me, passai.

O citadino do mundo que há, que se assina M.C.V., considerou Fernando Pessoa um" aldeão do mundo a haver". Será interessante comparar o reconhecimento mundial do "aldeão" com o do citadino. MCV é célebre em Portugal? Será célebre em Lisboa? Talvez , mas só mesmo  no grupo dos seus amigos...

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