Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

sábado, 20 de novembro de 2021

Saudades da Escola...

Saudades não as quero... Não mandes mais esta saudade
ouve os meus ais por caridade
ou eu então deixo esfriar esta paixão
amor podes mandar se for sincero
saudades isso não pois não as quero


 Dezasseis anos, talvez.
 Vejo-a, no café, cada manhã, 
A folhear, atenta, um compêndio de inglês,
 Com um perfume a Escola e a maçã. 

 Não me canso de a olhar. 
Às vezes, olha (Um velho!), num desvio de atenção,
 E logo volta a folha, 
Enquanto molha o bolo no «galão».

 Eu saio, com pesar, bebida a «bica».
 Ela é a minha manhã, 
Tão natural, tão clara... que ali fica.

 - Que saudades da Escola! Que fome de maçã!


Conheci, aos dezanove anos, o autor deste poema ...  Era um homem, à época, de 50 -60 anos( nesse tempo 50 ou 60 anos eram exatamente a mesmo idade...) pretensamente austero, mas irónico e muito gentleman . Contavam-se, em surdina, histórias sobre um rapaz da nossa idade,  que vinha , semanalmente, com ele de lisboa, mas nunca me preocupei com especulações sobre a vida alheia..


Era uma memória que pouco lhe ocorria, porque lhe dava a impressão de não lhe pertencer inteiramente, de que a tinha usurpado à vida de outro alguém, ( ...) uma mulher e uma casa que existiam apenas na sua mente.
 


 Conheci a semana passada a hélia correia: gosta da cultura grega, de gatos, detestaria de ser normal, admira a escrita de Gonçalo M. Tavares e de Gabriela Llansol, não entende por que razão as pessoas se casam, não aceita que uma jovem passe a adotar o apelido do marido, tem a mesma visão que eu da " invasão" da europa e escreve "para nada"...

 O que a memória ama, fica eterno. E o que a memória deixou de amar?

 Recorrdo o dia em que dei a última aula da minha vida. Poderá haver muitas aulas ; poderá haver outras aulas; poderá haver muita vida; poderá haver outras vidas... De qualquer modo, nesse dia dei  a última aula desta minha vida... Ao contrário do que sempre pensei, não senti nada, absolutamente nada, a não ser uma estranha indiferença... Não foi infelicidade nem alegria, foi mesmo um nada ...A minha manhã na escola foi exatamente igual a tantas outras... Imaginei que, neste momento derradeiro, rememoraria, com saudade lacrimejante, o dia em que cheguei à escola, os primeiros alunos, algumas turmas inesquecíveis, mas tal não aconteceu. Tudo deixou de fazer sentido e o eco no presente é um nada gelado, preocupantemente desinteressado. Como tenho fama de afetiva, alguns alunos mais chegados, sobretudo os do teatro, estavam desiludidos de não terem de me consolar e estupefactos com a minha fria serenidade. Cuidaram que era fingida, mas não o era: não senti nada, rigorosamente nada...Saí da escola sem olhar para trás, sem um vestígio de nostalgia. Esperei que a mágoa surgisse com o tempo, num setembro em que o não ter de regressar me desencadeasse uma qualquer crise, mas não consegui sentir nada. A minha proverbial emotividade esgotou-se, nada me interessa, nada me motiva... À força de o admirar , fiquei pessoana...

Não tenho saudades da escola, mas sinto falta da "maçã"...

Estou saturada de dias de ... Estou saturada de mulheres, de irmãos, de madrinhas, de pais, de declarações de amor de uma vulgaridade irritante... Não gosto  de gostar em público...Não gosto de quem gosta em público, exibindo a alma, os sentimentos, como catálogo de vendas ou produto em prateleira de supermercado... .. Quando será dia de nada, só um dia, só um dia de ser, um dia de pensar, um dia de ler, só um dia...
Professores: realidade e ficção.. Professores... É um tema inevitável, mas sempre adiado...Vou começar pela parte mais fáci: registar, cronologicamemte, para depois organizar um texto, os professores de que me recordo. Aqueles de quem ainda vejo as caras, os sorrisos, certos tiques caracterizadores, figurantes de alguns episódios mais marcantes. ( O efeito que eu, como professora, possa ter tido sobre alguns dos meus alunos, análise bem mais difícil, ficará para depois...) Escola primária Dona "perversa" - a minha primeira professora ,responsável pelo episódio humilhante com que iniciei a minha vida "académica". Loura, perfumada, estridente, com uns lábios crispados, bem reveladores da perversidade que aquele ser escondia. Não sei já como se chamava.Julgou que me podia ofender por eu não ser filha de doutor, mas enganou-se... Por me ter recusado a fazer a "virolinha " do o, a dona "perversa" pôs-me de castigo, durante um recreio, com um cartaz,a dizer:" Eu sou burra!" Acho que foi nesse momento que planeei o meu primeiro crime de paixão e ...bem sucedido. O meu pai,que era um santo, homem muito pacífico, com aquela mentalidade beirã de submissão ,não teria tido coragem de me defender; a minha mãe, sempre muito interventiva e opinosa, deve ter achado que eu, se não fazia o o com "virolinha" , mereci o que me aconteceu. Valeram-me os pais importantes das minhas amigas: "Se a professora não for expulsa, as nossas filhas saem do colégio..." O senhor diretor, um homem bom, que não concordara, secretamente, com tal castigo, pressionado por três papás doutores, expulsou a senhora professora que foi ensinar a fazer as "virolinhas" dos os para uma escola pública numa aldeola qualquer... Dona Margarida- deslavada,com uns óculos maiores do que a cara, sempre, sempre a escorregarem pelo nariz abaixo, boazinha, mas nada marcante.Só recordo os óculos numa carita pálida... Dona Olga- a primeira professora a sério: convicta, exigente mas justa. Demo-nos bem: gostei dela e julgo que ela também gostou de mim. Do 5º ao 9º de escolaridade, como frequentei um colégio, os professores pouco alteravam... Português- Doutora Adelaide e Senhor Diretor. Francês- Doutora Lia - um dos seres mais vegetais que conheci: boazinha, sempre queixosa e adoentada, era a imagem do desconsolo. Inglês - " A mãe do meu Luís"- sorridente, totalmente realizada como esposa e mãe, passava as aulas a falar( em português, naturalmente...) "do seu Luís"- Não recordo o nome dela, não me lembro de uma única aula ou frase, só ficou gravado na minha memória o ar embevecido com que ela dizia " o meu Luís" - era qualquer coisa de comovente. Quase todas as minhas colegas gozavam com ela, mas eu entendia a pobre senhora: só a necessidade de dar um bom futuro "ao seu Luís" a obrigava a aturar as filhas dos outros... Por ironia do destino, no 1º ano de direito, o Luis foi meu colega e os esforços da mãe valeram a pena: é atualmente diretor de uma importante companhia de seguros...A N, quando soube, disse-me indignada" Não acredito, aquele choninhas..." História - Doutora Manuela: gorda, desinteressante suspirosa , completada e depois substituída, pelo explicador/ Amigo / Idolo: o doutor P. Matemática- Doutora Raquel (Explicadora: Lili) Física e Química- Dona Maria- um verdadeiro monumento: doida,impetuosa, enérgica, alta, forte, possante, irreverente, uma raridade naquele tempo( diziam as más línguas que gostava de mulheres, frase de que, na época, eu não percebia exatamente o alcance...). As minhas estórias com ela,se eu fosse escritora, davam um romance... Um dia resolvi desafiar a dignidade da pressão atmosféria e, quando ele me pergunta," Cachopa linda, ( era assim que ela me chamava, pois todas tínhamos alcunhas)o que é a pressão atmosférica?". Eu armei-me em engraçadinha e respondi" Não sei nem me interessa...". Ela olha-me com um misto de fúria, indignação genuína e incrédula, arrasta-me para junto do quadro e , enquanto exemplificava, com lambadas e murros convictos, explicou: é uma força que se exerce da direita para a esquerda (com bofetada exemplificativa); da esquerda para a direita( idem); de cima para baixo (murro na cabeça); de baixo para cima( murro no queixo, que me fez trincar a língua e sangrar da boca). "Vamos lá ver se nunca mais te esqueces e vai lavar a boca que estás com ar de vampira...". Nunca mais me esqueci e, curiosamente, apesar de tudo, recordo-a com simpatia... Desenho- Senhor Engenheiro - sempre o tratámos assim, nunca lhe conheci nome ou apelido. Um homem bom, muito alto e magro, desengonçado, com ar, penso-o agora, de Álvaro de Campos... Todas o adorávamos e ele adorava as suas meninas... Geografia e Ciências - Doutora Adélia(minha vizinha , mulher de militar e irmã de um importante ministro, ainda hoje figura pública conceituada). Sempre a chupar pastilhas para as dores, era a imagem do sofrimento, julgo que por não poder ter filhos. Não era boa nem má, não nos despertava amor nem ódio, porque ela parecia um autómato. Era a doutora Adélia, coitada. Como se "coitada" fosse o seu apelido... Nem quando me perguntou onde ficava Casablanca e eu respondi que era a casa do presidente dos Estados Unidos, a senhora se indignou... Ginástica - Não tínhamos ( As meninas tinham de cuidar da alma e não do corpo...) Moral - "Irmã" - uma freira doroteia de óculos, absolutamente anónima, que nos ensinava a rezar, acefalamente, e mais nada... e uma professora de que não recordo o nome nem a cara, mas que foi moderadora num caso bem complexo... Lavores- Dona Violeta- Acho que sempre existiu em mim um feminismo latente, obviamente não racionalizado, que me levava a revoltar contra esta "disciplina", tal como, em casa, me insurgia contra o pôr a mesa e fazer a cama." Não faço nada disso: quando for crescida, tiro um curso e tenho empregada. Nem que me matem, não faço!!" Em casa, o meu pai protegia-me e livrava a "sua menina" das indignas tarefas domésticas; no colégio, o senhor diretor fingia que não sabia que eu fugia pela janela durante as aulas ( As aulas eram numa cave e, por motivos económicos, todas as alunas se juntavam no mesmo espaço, uma sala enorme retangular) para ir ler para o jardim, tendo andado 5 anos para fazer um naperon, concluído por uma prima mais dotada do que eu para os lavores...( Ainda hoje tenho guardada essa prova do meu triunfo sobre o sistema...). Não desgostava da Dona Violeta, mulher sisuda, mas amável, esperta e que não estava para se ralar: "se o senhor diretor acha que ler substitui o bordar quem sou eu para o discutir..." Canto Coral- Dona Ivonete - Era o que hoje chamaríamos uma "tia": bem vestida, requintada, snobe, com dois filhos considerados as coisas mais lindas do mundo, o que a tornava bastante popular, apesar de as aulas serem ao sábado à tarde. Com ela, paradoxalmente, não aprendi a cantar ( terceira voz desafinada), mas a representar. Eu tinha de participar, mas estava proibida de emitir um som, só fazia os gestos com a boca e a encenação que as meninas que cantavam a sério faziam. Eu e outra colega estávamos nesta situação, estatuto que até nem nos humilhava...Gostei dela e as "boas maneiras" que me ensinou ( ela dava-nos também aulas de etiqueta social) não me prejudicaram, antes pelo contrário. Ainda hoje, se me distraio e coloco os cotovelos em cima da mesa, durante uma refeição, recordo o ar horrorizado da dona Ivonete...e retiro-os imediatamente. Fugiram-me as palavras: vejo-as, perante mim, perfiladas numa linha de partida , a acenar-me... Organizaram-se por ordem alfabética e vão-me abandonar, eu sei. Tudo aquilo de que gostamos, mais cedo ou mais tarde, acaba por partir.. Sei-o bem, sempre o soube... O melhor é colocar-me na fila e, no meio da letra I, tentar encontrar um lugar para mim... Recordei-me , a propósito da letra I, da minha professora de OPAN, Organização Política e Administrativa da Nação, que , perante uma turma atónita, me insultou, despudoradamente: "Tu és um I desprezível: és fisicamente um I( era, na época, alta e magra); és um I na Ignorância, na Imbecilidade; és Idiota, és Insuportável, Insuportável." Fiquei em pé, impávida e serena, a ouvir aquela mulher detestável que, no fim dos insultos, me ameaçou, dizendo que eu teria 4 no fim do 2º período (Um 4, nesses tempos, implicava reprovação imediata). Peguei nas minhas coisas, olhei-a com desprezo, e só repetia " odeio-a, odeio-a, odeio-a". Antes que ela me mandasse embora, fugi do liceu por um caminho clandestino. Esse período foi-me bem funesto: a professora de latim, que confundia declinações com vestuário, dava-me negativa porque eu frequentemente não levava bata; a professora de inglês exigia que eu jurasse que faria os TPC e eu não jurava. Como fui infeliz naquele antro de feras... As saudades que tinha do meu antigo colégio e do meu diretor... Tudo me fugia, tal como as letras . Professores inesquecíveis Foi-me apresentada- era eu aluna de direito - por um jovem pianista, muito inteligente e talentoso ( de quem eu era musa inspiradora) com quem ela teve um namoro episódico. Ele era um eterno aluno, obeso, gelatinoso, tímido, com cara de mocho, mas de uma sensibilidade e cultura muito raras.Não sei se terei gostado dele, mas o "exigir" a minha presença nos recitais, o enlevo como que me olhava e o modo pausado,ritmado, como falava, agradavam-me. Tornámo-nos amigos e convivemos regular e literariamente vários anos. Foi nesse período que conheci a S, uma trintona que talvez tenha sido a mulher mais visivelmente feia que conheci: baixa, atarracada, vestida de um modo desairoso, muito vesga, com dentes irregulares, cabelo ralo e pele amarelenta. Não, isto não é uma caricatura perversa, ela fisicamente era daquelas feias em quem , mesmo o mais desatento e desinteressado, repara. A professora e o pianista eram,assim, um casal muito harmonioso, no que diz respeito ao contraste óbvio entre o retrato físico e o cultural. Fosse qual fosse a razão, o idílio entre eles terminou, nunca mais pensei na S. e continuei a deixar-me ser admirada pelo pianista que , um dia, me entrega um bilhete a dizer " Amo-a".Guardei serenamente o bilhete, olhei, sorri e nunca dei qualquer resposta. Ele nunca a exigiu. Um tempo depois, explicou,calma e desinteressadamente, que o bilhete não era um pedido, significava só o que lá estava escrito, mais nada... Continuámos as nossas conversas literárias,até eu ter ido viver para outra cidade... Reencontrei-o,nos anos 90, à porta da biblioteca da universidade, e gostámos de nos rever. Talvez até possa ter existido uma qualquer emoção, discreta, contida, no nosso inesperado reencontro. Curiosamente, ele muito mais magro e interessante e eu muito mais gorda e desinteressante, ironia , não do destino, mas do tempo...Combinámos que eu iria assistir a um concerto...Em jeito de despedida, perguntou-me:"É feliz?". Tal como fizera com o "Amo-a", olhei-o, sorri e não dei qualquer resposta... (Esta memória levou-me a pesquisar o nome dele e fiquei a saber que morreu no dia 6 de dezembro de 1997,com 55 anos, pouco tempo depois do nosso encontro... ) Quando regresso à faculdade, será fácil imaginar, nesta sequência novelesca, quem encontrei como professora, logo no primeiro ano ...As aulas de S eram inebriantes e melodiosas como um recital de piano : a limpidez do raciocínio e a eufonia mágica da língua que ensinava faziam esquecer a ausência de beleza física e tornámo-nos relativamente amigas, apesar de eu perceber , perfeitamente, que ela, além de adorar literatura, também adorava um certo aluno....Fui, então, sabedora de que , para ela, amor platónico só mesmo no Banquete e que era mais apreciadora da matéria do que do espírito de um homem...( Conversas intelectuais só com mulheres, dizia com uma malandrice verdadeiramente engraçada...) Um dia rebenta um escândalo clássico: a S namorava pública e descaradamente um ignorante, nada requintado, mas com um físico apolíneo e um ar de adónis com farda.Toda a faculdade cochichava , em nível de língua erudito, bem entendido, indignada com tamanha afronta: o fardado e a doutora, uma versão curiosa do belo e da monstra... A doutora, ainda por cima oriunda de famílias tradicionais, teve de pôr fim à sua bela história e começou a dar de beber à dor, o que cimentou, ou melhor, liquefez a nossa amizade, através de encontros num bar em que duas doutoras, outrora rivais, bebiam gins, acompanhados de diálogos socráticos ...Acabámos amigas: uniu-nos uma certa irreverência, o gim e Platão, apesar de ela dizer,com um tom particularmente vesgo: "a tua beleza é uma verdadeira afronta." (Confesso que tenho saudades do tempo em que a minha beleza era"uma afronta"...) Recordo uma afirmação, proferida com a emoção possível, no ser mais seráfico e afetivamente distante que conheci: “A ciência do século IV aC é igual a Aristóteles.“.Como tivesse reparado que eu estava a registar a afirmação, calou-se, fechou os olhos e, depois de me fitar, com uma ternura inexpressiva, mas, de qualquer modo, ternura, disse” Aristóteles é a ciência do século IV Ac.”. A partir daí, a aula passou a ser só para mim. Imaginação, decerto, mas, nessa hora, pensei-me como o ser mais ditoso num mundo perfeito… Um único homem, o seu pensamento, era a ciência, era a explicação. O mundo era tão limitado que era fácil pensar em linha reta. Ainda o escuta, ainda o observo, de olhos fechados, emocionado: " Huc ades, o Galathea...?". ( ...os humanos são universalmente conhecidos como os únicos animais capazes de mentir, sendo certo que se às vezes o fazem por medo, e às vezes por interesse, também às vezes o fazem porque perceberam a tempo que essa era a única maneira ao seu alcance de defenderem a verdade.) Que mistura de emoções. Que coincidências despropositadas. O passado regressa, projeta-se no presente num mar de recordações de ontem e de hoje...A galateia de ácis/ polifemo e a galateia de pigmalião misturam-se, numa simbiose magoada que marcará para sempre a minha vida; Kafka repete a atitude de vergílio...Huc ades, o Galathea? (" Huc ades, o Galathea...?" ) No fim dessa aula, o convite, tímido, inesperado, algo perturbador, e o almoço no bar das farmácias...Após a descoberta de que eu gostava de vinho verde branco seco, verbalizou a única manifestação de um qualquer afeto que sempre pressenti, ao longo dos três anos em que fui sua aluna: "Como é perfeita, minha senhora...". Era uma admiração silenciosa, plena de gentilezas inúmeras, de pequenos gestos de cortesia, de sóbrios elogios à minha sensibilidade e à minha consciência sintática... Quando acabei o curso, já em agosto, no instituto clássico, o convite para assistente, que recusei porque fui uma tonta... Um ano depois, a desilusão por eu ter optado por fazer o mestrado em literatura portuguesa e não em literatura latina: "como lamento, minha senhora, como eu lamento a sua infausta decisão" Contrastes.. Um atrasado mental, a humilhação de ter de pedir a um colega que fosse comigo porque o senhor prior, certamente confundindo prova oral com confissão, resolveu fazer-me oral só a mim , num gabinete dos estudos clássicos...Eu intui que seria prudente ir acompanhada, o que o enfureceu. Fui à oral com 18, uma nota absolutamente rara, e ele resolve obrigar-me a traduzir um texto da peregrinatio, à primeira vista, sem anotações, sem dicionário, o que nunca, por nunca ser, é exigido, particularmente num documento do século IV... Quando me capacitei de que o símio que estava à minha frente não me ia deixar usar o dicionário, senti-me capaz de o espancar. Por momentos arrependi-me de ter levado uma testemunha: ali, só os dois... seria o crime perfeito. Claro que o que aconteceu foi não ter conseguido traduzir nada de jeito, ele desce-me a nota para 16....É outro dos meus traços definidores: sou imaginativa, mas cobarde . Nunca concretizo os meus projetos de vingar o mal e as afrontas que me fazem: limito-me a esperar,amuar e entristecer... Nunca me consegui libertar da santidade contida que se me colou à alma...

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