Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

quarta-feira, 11 de maio de 2016

Incoerências coerentes...

Não gosto de antónio lobo antunes, mas ...Às vezes, a meio da noite, um grito. Há alturas em que penso que sou eu quem grita, embora não grite nunca:sempre calei os gritos todos em mim...

When you've seen beyond yourself Then you may find peace of mind is waiting there And the time will come when you see We're all one and life flows on within you and without you

E também,porventura, Swann fitava naquele rosto de Odette ainda não possuído, nem sequer ainda por si beijado, que via pela última vez,aquele olhar com que, num dia de partida, gostaríamos de levar connosco uma paisagem que vamos abandonar para sempre.

Usualmente as criaturas são-nos tão indiferentes que, quando atribuímos a uma delas determinadas possibilidades de sofrimento e de alegria para nós, essa parece-nos pertencer a outro universo, rodeia-se de poesia,faz da nossa vida um espaço comovente onde ela estará mais ou menos próxima de nós . Swann não era capaz de se interrogar sem perturbação sobre o que Odette viria a ser para ele nos anos que iriam seguir-se.

"la Recherche du temps perdu est hantée du début à la fin par une « petite phrase » musicale, cinq notes qui, de Swann au Narrateur, composent, rassemblent, incarnent, expriment et attisent la totalité de leurs sentiments... à quoi tient ce génie ? Cette puissance inouïe ? Ce privilège de la musique ? Quelle place occupe Vinteuil dans la composition de la Recherche du Temps perdu ? Comment la musique parvient-elle, mieux que le langage, à garantir l’éternité des sensations?"

A pequena frase continuava a associar-se para Swann ao amor que tinha por Odette. Sentia bem que aquele amor não correspondia a nada de exterior ,de verificável por outros que não ele... E muitas vezes quando era a inteligência positiva a única a reinar sobre Swann, ele pretendia deixar de sacrificar tantos interesses intelectuais e sociais àquele prazer imaginário...Aquela sede de um encanto desconhecido, era a pequena frase que a despertava, mas não lhe dava nada de definido para a saciar...Começava a dar-se conta de tudo o que havia de doloroso, talvez até de secretamente não apaziguado no fundo da doçura daquela frase,mas não o podia aguentar...

Os lugares que conhecemos só pertencem ao mundo do espaço em que os situamos para maior facilidade...A recordação de uma determinada imagem não passa da nostalgia de um determinado momento; e as casas, as estradas,as avenidas, são infelizmente fugazes, como os anos.



Mandava que Odette a tocasse dez vezes,vinte vezes,exigindo que ao mesmo tempo não parasse de o beijar. Cada beijo atrai outro beijo. Ah, naqueles primeiros tempos em que amamos, os beijos nascem tão naturalmente! Proliferam tão apertados uns contra os outros, que seria tão custoso contar os beijos que se dão durante uma hora como as flores de um campo do mês de Maio.



Excepto quando lhe pedia que tocasse a pequena frase de Vinteuil, em lugar da Valsa das Rosas, Swann não procurava obrigá-la a tocar as coisas de que gostava e, tanto em música como em literatura, não tentava corrigir o seu mau gosto. Tinha efetiva consciência de que ela não era inteligente.

" E pensar que estraguei anos da minha vida, que desejei morrer, que dediquei o meu maior amor a uma mulher que não me agradava, que não era o meu tipo."



A coerência é a virtude dos imbecis. O homem que pretende ser sempre coerente no seu pensamento e nas suas decisões morais ou é uma múmia ambulante ou, se não conseguiu sufocar toda a sua vitalidade, um mono maníaco fanático... A coerência, a convicção, a certeza são demonstrações evidentes - quantas vezes escusadas - de falta de educação. É uma falta de cortesia com os outros ser sempre o mesmo à vista deles; é maçá-los, apoquentá-los com a nossa falta de variedade.Adoro as boas pessoas; odeio as boas pessoas...Adoro-me; odeio-me


Não te amo, quero-te: o amar vem d’alma.
E eu n’alma - tenho a calma,
A calma - do jazigo.
Ai! não te amo, não.

E infame sou, porque te quero; e tanto
Que de mim tenho espanto,
De ti medo e terror...
Mas amar!... não te amo, não.


Permaneci, mas já não me sou.
Sou todo incoerências. Vivo desolado, abatido, parado de energia, e admiro a vida, entanto como nunca ninguém a admirou!
Se ao menos eu permanecesse aquém...


Vendo-me de fora, como quase sempre me vejo, eu sou um inapto à acção, perturbado ante ter que dar passos e fazer gestos, inábil para falar com os outros, sem lucidez interior para me entreter com o que me cause esforço ao espírito, nem sequência física para me aplicar a qualquer mero mecanismo de entretenimento trabalhando.(...) Toda a realidade me perturba. A fala dos outros lança-me numa angústia enorme. A realidade das outras almas surpreende-me constantemente. A vasta rede de inconsciências que é toda a acção que eu vejo, parece-me uma ilusão absurda, sem coerência plausível, nada. (...)Porque eu não só sou um sonhador, mas sou um sonhador exclusivamente. O hábito único de sonhar deu-me uma extraordinária nitidez de visão interior. Não só vejo com espantoso e às vezes perturbante relevo as figuras e os décors dos meus sonhos, mas com igual relevo vejo as minhas ideias abstractas, os meus sentimentos humanos — o que deles me resta —, os meus secretos impulsos, as minhas atitudes físicas diante de mim próprio. Afirmo que as minhas próprias ideias abstractas, eu as vejo em mim, eu com uma interior visão real as vejo num espaço interno. E assim os seus meandros são-me visíveis nos seus mínimos. Por isso conheço-me inteiramente, e, através de conhecer-me inteiramente, conheço inteiramente a humanidade toda. Não há baixo impulso, como não há nobre intuito que me não tenha sido relâmpago na alma; e eu sei com que gestos cada um se mostra. Sob as más-caras que as más ideias usam, de boas ou indiferentes, mesmo dentro de nós eu pelos gestos as conheço por quem são. Sei o que em nós se esforça por nos iludir. E assim à maioria das pessoas que vejo conheço melhor do que eles a si próprios. Aplico-me muitas vezes a sondá-los, porque assim os torno meus. Conquisto o psiquismo que explico, porque para mim sonhar é possuir. E assim se vê como é natural que eu, sonhador que sou, seja o analítico que me reconheço.



Existe uma certa grandeza em repetir todos os dias a mesma coisa. O homem só vive de detalhes e as manias têm uma força enorme: são elas que nos sustentam.

Nenhum de nós sabe o que existe e o que não existe. Vivemos de palavras. Vamos até à cova com palavras. Submetem-nos, subjugam-nos. Pesam toneladas, têm a espessura de montanhas. São as palavras que nos contêm, são as palavras que nos conduzem. Mas há momentos em que cada um redobra de proporções, há momentos em que a vida se me afigura iluminada por outra claridade. Há momentos em que cada um grita: - Eu não vivi! eu não vivi! eu não vivi! - Há momentos em que deparamos com outra figura maior, que nos mete medo. A vida é só isto?


Sou um mero espectador da vida, que não tenta explicá-la. Não afirmo nem nego. Há muito que fujo de julgar os homens, e, a cada hora que passa, a vida me parece ou muito complicada e misteriosa ou muito simples e profunda. Não aprendo até morrer - desaprendo até morrer. Não sei nada, não sei nada, e saio deste mundo com a convicção de que não é a razão nem a verdade que nos guiam: só a paixão e a quimera nos levam a resoluções definitivas.
O papel dos doidos é de primeira importância neste triste planeta, embora depois os outros tentem corrigi-lo e canalizá-lo... Também entendo que é tão difícil asseverar a exactidão dum facto como julgar um homem com justiça. Todos os dias mudamos de opinião. Todos os dias somos empurrados para léguas de distância por uma coisa frenética, que nos leva não sei para onde. Sucede sempre que, passados meses sobre o que escrevo - eu próprio duvido e hesito. Sinto que não me pertenço... É por isso que não condeno nem explico nada, e fujo até de descer dentro de mim próprio, para não reconhecer com espanto que sou absurdo - para não ter de discriminar até que ponto creio ou não creio, e de verificar o que me pertence e o que pertence aos mortos. De resto isto de ter opiniões não é fácil. Sempre que me dei a esse luxo, fui forçado a reconhecer que eram falsas ou erróneas.


Diminuir o barulho é aumentar o silêncio. Diminuir a luz é aumentar a escuridão. Portanto, diminuir uma coisa é aumentar o seu oposto.

Um mapa é um papel que impede que olhes para as coisas. Um mapa da cidade de Veneza esconde-te a cidade de Veneza. Visitares uma cidade, sempre com o mapa à frente, é como colocares uma venda nos próprios olhos.

O fim justifica os meios.
E se bem julgue esta obra indigna da presença de Vossa Magnificência, não menos confio que deva ela ser aceite, considerado que de minha parte não lhe possa ser feito maior oferecimento senão o dar-lhe a faculdade de poder, em tempo assaz breve, compreender tudo aquilo que eu, em tantos anos e com tantos incómodos e perigos, vim a conhecer. Não ornei este trabalho, nem o enchi de períodos sonoros ou de palavras pomposas e magníficas, ou de qualquer outra figura de retórica ou ornamento extrínseco, com os quais muitos costumam desenvolver e enfeitar suas obras; e isto porque não quero que outra coisa o valorize, a não ser a variedade da matéria e a gravidade do assunto a tornarem-no agradável.

Os homens mudam de bom grado de senhor,convencidos de que vão encontrar melhor.


Todos veem o que pareces, poucos percebem o que és.

Os homens hesitam menos em ofender quem se faz amar do que em ofender quem se faz temer; porque o amor é mantido por um vínculo de obrigação que, por serem os homens pérfidos, é rompido por qualquer ocasião em benefício próprio; mas o temor é mantido por um medo de punição que não abandona jamais.

Os homens devem ser adulados ou destruídos, pois podem vingar-se das ofensas leves, não das graves; de modo que a ofensa que se faz ao homem deve ser de tal ordem que não se tema a vingança.

As injúrias devem ser feitas todas de uma só vez, a fim de que, saboreando-as menos, ofendam menos: e os benefícios devem ser feitos pouco a pouco, a fim de que sejam mais bem saboreados.

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