Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

sábado, 27 de março de 2021

Teatro: uma saudade...Humor: uma incapacidade...

O importante é saber ser...


To be , or not to be, that is the question, 
 Whether' tis nobler in the mind to suffer 
The slings an arrows of outrageous fortune, 
Or to take arms against a sea of troubles,
And by opposing end them.To die, to sleep -


Ser ou não ser, é isso a questão, 
 Será mais nobre deixar que o espírito suporte 
Os golpes e as setas da fortuna ultrajante 
 Ou erguer armas contra um mar de angústias
E, não aceitando, pôr-lhes termo? Morrer, dormir 
Dormir e talvez sonhar.
Ato III, Cena 1

Eu sei ser...


O importante é gostar...

"Todavia, nunca passa de moda o protesto contra as coisas sagradas que se mostra só da boca para fora, sem penetrar o coração; ou contra a confusão do cristianismo com toda a sorte de pessoas cuja religião, para citar Swift, só serve para se odiarem e não basta para se amarem uns aos outros." Prefácio de Charles Dickens à edição de 1867 

 "Os Cadernos de Pickwick foram e são um clássico instantâneo, uma referência na comédia de situação, de linguagem e de personagem, cuja influência se percebe em obras de todos os tipos - não apenas nas estritamente humorísticas. É um livro inocente sobre a inocência, em que tanto o protagonista como o autor vão, a pouco e pouco, deixando de ser inocentes. O eterno Sr. Pickwick, que começa por ser um pateta pomposo e ridículo, é, no final do livro, um homem bondoso e puro - e, no entanto, temos a sensação que não foi ele quem mudou. AS personagens mudam pouco ou nada, ao longo do romance, mas o autor e o leitor mudam. O sarcasmo de Dickens, e o nosso, transforma-se em admiração, embora o Sr. Pickwick se mantenha igual - como os deuses. Como diz Chesterton, «Dickens não escreveu exactamente literatura, escreveu mitologia" 

 "Antes de mais, deve registar-se o primeiro adjectivo que qualifica o Sr. Pickwick: imortal. Segundo nos diz o título completo do livro, os papéis que documentam a sua vida são póstumos – mas, o que é curioso, ele é imortal logo desde a primeira linha. Dickens está, claro, a ser irónico, mas a ironia contida naquele "imortal" dura apenas umas dezenas de páginas – e de dias: muito rapidamente, o Sr. Pickwick tornou-se imortal a sério, quer no livro, quer fora dele. (...) Em Outubro de 1837, o crítico da "Quarterly Review" registava que "menos de seis meses após a publicação do primeiro número, todo o público leitor falava" das aventuras do Sr. Pickwick. Sobretudo depois do aparecimento de Sam Weller na narrativa, as vendas dos fascículos dispararam, deram origem a "merchandising" (polainas Pickwick, bengalas Pickwick, chapéus Pickwick, charutos Pickwick) e à formação de clubes Pickwick (que ainda hoje existem) em que cada membro adoptava o nome de uma das personagens do romance. Um leitor rebentou um vaso sanguíneo, de tanto rir, e os amigos lamentaram a sua sorte quando o médico o proibiu de prosseguir a leitura. Thomas Carlyle, numa carta ao primeiro biógrafo de Dickens, conta o desconsolo de certo padre que, depois de prestar conforto espiritual a um enfermo, o ouviu suspirar: "Bom, o que interessa é que daqui a dez dias sai mais um número dos Cadernos de Pickwick, graças a Deus." - Prefácio de Ricardo Araújo Pereira 

Pickwick, Tupman, Snodgrass e Winkle, membros do clube ao qual o primeiro dá nome, passam os dias a viajar pelo interior de Inglaterra em busca de conhecer melhor, não só os locais, mas também as pessoas que neles habitam. Vão fazendo descobertas Fazem assim descobertas, de vários tipos, conhecem personagens bem peculiares, vivem situações ridículas que tornam as viagens inesquecíveis...

 
O sol, pontual servidor de todos os trabalhos, acabava de nascer e começava a alumiar a manhã do dia treze de Maio de mil e oitocentos e vinte e sete, quando Samuel Pickwick se ergueu, tal outro sol, dos seus sonhos, abriu de par em par a janela do quarto e espreitou o mundo em baixo. Deixemos o nosso velho amigo num desses momentos de felicidade plena, que somos sempre capazes de encontrar, se os procurarmos, para animar a nossa existência transitória neste mundo. 

Há sombras tenebrosas na terra, mas as suas luzes são mais fortes por contraste. Alguns, como as corujas ou os morcegos, têm melhores olhos para as trevas do que para a luz.

Poucos momentos haverá na vida de um homem que se possam comparar, na experiência do sofrimento ridículo e de uma proporcional falta de compaixão e caridade, à corrida atrás do próprio chapéu. 

  Não acham extraordinária a impressão de que é nosso destino entrar em casa de toda a gente para os meter em qualquer espécie de sarilho?

Eu não sei gostar...Reconheço a indiscutível qualidade do processo de escrita, reconheço a genialidade do sentido de humor, mas eu  não sei gostar.

Será que a opinião de Pessoa/ Bernardo Soares me motiva? 

"Em minha infância e primeira adolescência houve para mirn, que vivia e era educado em terras inglesas, um livro supremo e envolvente — os «Pickwick Papers», de Dickens; ainda hoje, e por isso, o leio e releio como se não fizesse mais que 1embrar." Fernando Pessoa, [Carta a José Osório de Oliveira - 1932]

 "Deixei para trás o hábito de ler. Já nada leio a não ser um ou outro jornal, literatura ligeira e ocasionalmente livros técnicos relacionados com o que porventura estudo e em que o simples raciocínio possa ser insuficiente."

"Há um livro de que ando sempre acompanhado —As Aventuras de Pickwick. Li várias vezes os livros de Mr. W. W. Jacobs. O declínio do romance policial fechou para sempre uma das minhas portas de acesso à literatura moderna."

"Descobri que a leitura é uma forma servil de sonhar. Se tenho de sonhar, porque não sonhar os meus próprios sonhos? "

Ter já lido os Pickwick Papers é uma das grandes tragédias da minha vida. (Não posso tornar a relê-lo.) -Vol Há criaturas que sofrem realmente por não poder ter vivido na vida real com o Sr. Pickwick e ter apertado a mão ao Sr. Wardle. Sou um desses. Tenho chorado lágrimas verdadeiras sobre esse romance, por não ter vivido naquele tempo, com aquela gente, gente real.

"Os desastres dos romances são sempre belos porque não corre sangue autêntico neles, nem apodrecem os mortos nos romances, nem a podridão é podre nos romances."

"Quando o Sr. Pickwick é ridículo, não é ridículo, porque o é num romance. Quem sabe se o romance não será uma mais perfeita realidade e vida que Deus cria através de nós, que nós — quem sabe — existimos apenas para criar? As analogias parece não existirem senão para produzir arte e literatura; é, palavras, o que dela fala e fica. Porque não serão essas figuras extra humanas verdadeiramente reais? Dói-me mal na existência mental pensar que isto possa ser assim." – Bernardo Soares


"Um grande tempo clama por homens grandes. Há heróis incógnitos, gente humilde, sem a glória e a história de Napoleão. A análise do seu carácter, porém, ensombraria até a fama de Alexandre da Macedónia. Hoje podeis encontrar, nas ruas de Praga, um homem de aspecto mal amanhado, e nem ele próprio sabe o que representa na história do novo grande tempo. Segue modestamente o seu caminho, não incomoda ninguém, nem é, ele próprio, incomodado por jornalistas que lhe peçam entrevistas. Se lhe perguntásseis como se chama, responderia, com toda a simplicidade e modéstia: «Sou o Švejk...» E este homem mal amanhado, sossegado e humilde é realmente esse bom e velho soldado Švejk, heróico e valente, que outrora, nos tempos da Áustria, andou nas bocas de todos os cidadãos do Reino da Boémia, e cuja reputação nem na República há de empalidecer. Gosto muito do bom soldado Švejk, e, à medida que vos desvendar os seus destinos durante a Guerra Mundial, estou convencido de que todos ireis simpatizar com este herói incógnito. Ele não deitou fogo ao templo da deusa em Éfeso, como o fez esse parvo do Heróstrates, a ver se ia parar aos jornais e aos manuais escolares. E isso basta." Jaroslav Hasek

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