As virtudes cardeais são quatro: temperança, prudência,força e justiça...
Sou ,discutivelmente, virtuosa: moderada, desmesuradamente moderada; prudente, excessivamente prudente; forte, dramaticamente forte; justa, obsessivamente justa...
Tendo em conta que a prudência era designada por sapientia, quem duvidará de que sou uma mulher virtuosa?
Virtus,para os romanos, é a qualidade do vir, do homem. A igreja e o catolicismo baralharam tudo, nisto como noutros domínios, e deturparam a virtude. Resta- lhe a consolação que estas virtudes foram pensadas por platão, homem por quem tem apreço. Sim porque, quanto a virtudes teologais, não tem qualquer hipótese: não fé nem esperança nem caridade….
Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Se fosse menos virtuosa, se não fosse a obsessão de ser perfeita , talvez tivesse conseguido ser qualquer coisa, não sei bem o quê, mas qualquer coisa... Qualquer coisa. Qualquer.Se...
Temos todos duas vidas: A verdadeira, que é a que sonhamos na infância, E que continuamos sonhando, adultos num substrato de névoa; A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros, Que é a prática, a útil, Aquela em que acabam por nos meter num caixão. Na outra não há caixões, nem mortes, Há só ilustrações de infância: Grandes livros coloridos, para ver mas não ler; Grandes páginas de cores para recordar mais tarde. Na outra somos nós, Na outra vivemos; Nesta morremos, que é o que viver quer dizer; Neste momento, pela náusea, vivo na outra...
Aqui, diante de mim,eu, pecador, me confesso de ser assim como sou...
Me confesso possesso das virtudes teologais, que são três,e dos pecados mortais,que são sete...
Me confesso de ser charco e luar de charco, à mistura. De ser a corda do arco que atira setas acima e abaixo da minha altura.
Me confesso de ser homem.De ser um anjo caído do tal céu que Deus governa;de ser um monstro saído do buraco mais fundo da caverna.Me confesso de ser eu.
Será que a virtude se pode ensinar?
O homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das coisas que não são, enquanto não são.
Realmente, Sócrates, é preciso que um estrangeiro que vai às grandes cidades e nelas persuada os melhores dos seus jovens a abandonarem outras companhias, de conterrâneos ou estrangeiros, de mais velhos ou de mais novos, e a associarem-se a ele para assim se tornarem melhores.
Protágoras, ao observar estes exemplos, não creio que a virtude se possa ensinar. Contudo, depois de te ouvir dizer que pode, rendo-me a considerar que há algo no que dizes, porque creio que és conhecedor de muitos assuntos, muitos que aprendeste e outros que tu próprio descobriste. Portanto, se entenderes possível, demonstra-nos de que modo se ensina a virtude. Não nos recuses essa demonstração.
A virtude principal da literatura - o não ser música - é ao mesmo tempo o seu principal defeito. Tem que ser composta e expressa em uma língua qualquer. Tem, portanto, por mais largamente que essa língua seja falada ou conhecida, que se não dirigir plenariamente à maioria do género humano. Aquilo por onde é mais explícita que qualquer outra arte, por isso mesmo é menos universal que ela.
Ocorre, pois, perguntar por que processo, em literatura, é alguém universalmente célebre, como, ainda que poucos, há relativamente tantos que o são; porque processo são célebres no espaço, e sobretudo no espaço e no tempo, quando forçosamente, e mormente na poesia, que é a espécie literária mais alta, nenhuma tradução, supondo que existe, pode dar conhecimento da obra em sua completa e verdadeira vida.
Porque o certo é que, a maioria de nós, não mentimos nem fingimos quando, ignorantes do grego, sofremos o entusiasmo de Homero, ou, hóspedes e peregrinos no latim, temos o culto de Horácio ou de Catulo. Não mentimos nem fingimos; pressentimos. E esse pressentimento, feito de não sei que misto de intuição, de sugestão e de entendimento obscuro, é uma espécie de tradutor invisível, que acompanha pelas eras fora, e torna universal como a música, a arte dada em linguagem, esse produto de Babel, com cuja queda o homem pela segunda vez caiu.
Nenhum prémio certo tem a virtude, nenhum castigo certo , o pecado. Nem seria justo que houvesse tal prémio ou tal castigo. Virtude ou pecado são manifestações inevitáveis de organismos condenados a um ou a outro, servindo a pena de serem bons ou a pena de serem maus. Por isso todas as religiões colocam as recompensas e os castigos merecidos por quem, nada sendo nem podendo, nada pôde merecer, em outros mundos, de que nenhuma ciência pode dar notícia, de que nenhuma fé pode transmitir a visão.(…) A vida, disse Tarde, é a busca do impossível através do inútil. Busquemos sempre o impossível, porque tal é o nosso fado; busquemo-lo através do inútil, porque não passa caminho por outro ponto; ascendamos, porém, à consciência de que nada buscamos que possa obter-se, de que por nada passamos que mereça um carinho ou uma saudade. Cansamo-nos de tudo, excepto de compreender, disse o escoliasta.
Se os pecados mortais são sete, como apreciadora de simetrias e de paralelismos, parece-me que deveria haver também sete vícios.
Museo de la Novela de la "Eterna" y la Niña de dolor, la "Dulce Persona" de- un- amor que no fue sabido.
Ler é um vício...Ler-se é um vício :percorre as páginas dos outros à sua procura. Talvez um dia se encontre...
Não é sensato deixar um dragão fora dos teus cálculos se vives perto dele...
A solidão é um vício: precisa de ser só para poder ser, pois só, sendo só, é, mas… Leva-me contigo, e das nossas duas misérias faremos, talvez, uma espécie de felicidade.
Amar será um vício?
Amar é pensar, como diz caeiro... Se pensar for um vício, então amar também o é...
Pensar incomoda como andar à chuva Quando o vento cresce e parece que chove mais.
Andar à chuva,com muito vento, incomoda tanto como pensar. Será esta afirmação equivalente à anterior?Vai pensar...
Tanta chuva caiu que quase não existe Uma flor no jardim da minha fantasia.
Pensar é um vício...
Não é o vício Nem a experiência que desflora a alma:É só o pensamento. Há inocência Em Nero mesmo e em Tibério louco Porque há inconsciência. Só pensar Desflora até ao íntimo do ser. Este perpétuo analisar de tudo,Este buscar duma nudez suprema Raciocinada coerentemente, É que tira a inocência verdadeira Pela suprema consciência funda De si, do mundo, de todos. Guarde, guarde Fora do vício e do vil mundo além Em gruta ou solidão o eremita; Se o pensamento vir tudo (...)Pensar, pensar e não poder viver!
Está assustada com o vazio; a vida parece não fazer qualquer sentido. Sem ocupações concretas, a vida escancara-se perante os seus olhos e ela não gosta do que vê... deseja as contas e mais contas, em eróticas tabelas excel que desformatam ... É aliciante a atenção que isso requer, sentia-se viva e realizada a corrigir testes. Não há tabela que se compare a afirmações tão geniais que a levam a repensar, a reler, para descobrir que o incesto não é entre irmãos, mas assume contornos de tragédia edipiana. Como vai existir sem a sensação inebriante de ler 30 vezes que blá, blá...esse estímulo dos amores literários, através do olhar de jovens criativos para quem a realidade afetiva se resume a "um gajo curtir com uma gaja"...esse alimento da alma que lhe dizia que o seu esforço, a sua vida como professora, não valia a pena para a generalidade dos alunos... A grosseria espiritual que lhe era comunicada rejuvenescia-a ...Gostava de ver a vida, através dos olhos dos alunos...
Que capacidade impiedosa a minha de fingir ser normal o tempo todo.
Prefere ser ...metamorfose ambulante...
O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente.
É ainda mais fingidora do que pessoa: finge o que é, finge o que pensa,finge o que sente,finge o que vive...Até finge que finge, quando, afinal,não está a fingir...
Fingir é o vício número seis...
Falta o seu vício mais inconfessável... Tão inconfessável que não o confessa...Mas são sete, tal como os pecados...Todo o prazer é um vício, porque buscar o prazer é o que todos fazem na vida, e o único vício negro é fazer o que toda a gente faz.
Ai de nós! os vícios do homem, por mais cheios de horror que os imaginemos, contêm a prova do seu gosto do infinito; simplesmente ,é um gosto que muitas vezes se engana no caminho.
O abismo da autodestruição, as circunstâncias que podem levar ao fim da alma. Se muitos escritores ficaram famosos por abuso de álcool, só Lowry foi capaz de escrever verdadeiramente sobre ele...
Não se pode viver sem amar...
O Cônsul não estava realmente a falar. Pelo menos, não parecia que estivesse. Não articulara uma palavra que fosse. Era tudo uma ilusão, um redemoinhante caos cerebral do qual, saiu por fim, nesse mesmo instante, bem ordenado e completo, o seguinte:
- O ato de um louco ou de um bêbedo - disse - ou o de um homem submetido a uma violenta excitação parece menos livre e mais inevitável para aquele que conhece a condição mental do homem que praticou a ação, e mais livre e menos inevitável para aquele que a não conhece. Era como uma peça ao piano, era como aquela peçazita em sete bemóis, tocada apenas nas teclas pretas. Era por isso, mais ou menos - lembrava-se agora - que ele tinha ido para o «excusado»; em primeiro lugar para se lembrar, para se assenhorear do assunto - era talvez também como o caso da citação que Hugh fizera de Matthew Arnold a respeito de Marco Aurélio, como aquela peçazita que ele aprendera com tanto custo havia anos, apenas para a esquecer sempre que tinha especial empenho em tocá-la, até que um dia se embebedara de tal maneira que os dedos se lembraram por si mesmos da combinação musical, revelando-se miraculosamente, em sua perfeição, em toda a riqueza da melodia; simplesmente aqui Tolstoi não fornecera a melodia.(...)
Quando nós não compreendemos nada das causas de um ato - digo isto para o caso em que o teu espírito tenha vagueado através da tua própria conversação pelos acontecimentos desta tarde - atribuímos essas causas, quer viciosas, quer virtuosas, de acordo com Tolstoi, ao predomínio de um elemento da vontade independente. Segundo Tolstoi, portanto, devíamos ter tido menos relutância em interferir do que tivemos...
- Todos os casos - sem excepção - nos quais a nossa concepção de livre vontade varia, dependem de três causas - prosseguiu o Cônsul. - Não podemos fugir a isso. Além disso, segundo Tolstoi - antes de julgarmos um ladrão - se é que realmente de um ladrão se trata - teríamos de perguntar a nós próprios quais eram as suas relações com outros ladrões, quais os seus laços de família, o seu lugar no tempo e, se até isso conseguíssemos saber, quais as suas relações com o mundo externo e com as consequências que o levaram a atuar
Vísceras - Aviso do autor - Se não achar este conto nada de especial, ou achar até divertido e, de alguma forma, engraçado, vá buscar ajuda psiquiátrica, ou comece a escrever.
Inspire.
Inspire o máximo de ar que conseguir. Esta história deve durar aproximadamente o tempo que consegue suster a sua respiração, e um pouco mais. Então escute o mais rápido que puder.
Um amigo meu aos 13 anos ouviu falar sobre “fio-terra”. Isso é quando alguém enfia um consolo no anus. Estimule a próstata o suficiente, e os rumores dizem que poderá ter orgasmos explosivos sem usar as mãos. Nessa idade, esse amigo é um pequeno maníaco sexual. Ele está sempre à procura de uma melhor forma de sentir prazer. Ele sai para comprar uma cenoura e lubrificante. Para conduzir uma pesquisa particular. Ele então imagina como seria a cena na caixa do supermercado, a solitária cenoura e o lubrificante percorrendo pela esteira o caminho até o empregado na caixa. Todos os clientes à espera na fila, observando. Todos a observar a grande noite que ele preparou.
Então, esse amigo compra leite, ovos, açúcar e uma cenoura, todos os ingredientes para um bolo de cenoura. E vaselina. Como se ele fosse para casa enfiar um bolo de cenoura no rabo.
Em casa, ele corta a ponta da cenoura com um alicate. Ele lubrifica -a e desce o seu anus por ela. Então, nada. Nenhum orgasmo. Nada acontece, exceto dor.
Então, a mãe desse garoto chama-o a dizer que é a hora de jantar. Ela diz para descer, imediatamente.
Ele remove a cenoura e coloca a coisa pegajosa e imunda no meio das roupas sujas debaixo da cama.
Depois do jantar, ele procura pela cenoura, mas ela já não está lá. Todas as suas roupas sujas, enquanto ele jantava, foram recolhidas pela sua mãe para as lavar. Não havia como ela não encontrar a cenoura, cuidadosamente esculpida com uma faca da cozinha, ainda lustrosa de lubrificante e fedorenta.
Esse meu amigo meu espera por meses, em silêncio, aguardando que os seus pais o confrontem. E eles nunca fazem isso. Nunca. Mesmo agora que ele cresceu, aquela cenoura invisível aparece em todas as ceias de Natal, em todas as festas de aniversário. Em toda caça de ovos de páscoa com os seus filhos, os netos dos seus pais, aquela cenoura fantasma paira em cima de todos eles. Isso é algo vergonhoso demais para ter um nome.
As pessoas em França usam uma expressão: “sagacidade de escadas.” Em francês: esprit de l’escalier. Representa aquele momento em que se encontra a resposta, mas é tarde demais. Digamos que está numa festa e alguém o insulta. Precisa dizer algo. Então sob pressão, com todos olhando, você diz algo estúpido. Mas no momento em que sai da festa… enquanto você desce as escadas, então – mágica. Você pensa na coisa mais perfeita que poderia ter dito. A réplica mais avassaladora. Esse é o espírito da escada.
O problema é que até mesmo os franceses não possuem uma expressão para as coisas estúpidas que se dizem sob pressão. Essas coisas estúpidas e desesperadas que pensa ou faz.
Alguns atos são baixos demais para receberem um nome. Baixos demais para serem discutidos.
Agora que me recordo que os especialistas em psicologia dos jovens, os conselheiros escolares, dizem que a maioria dos casos de suicídio de adolescentes eram garotos, que se estrangulavam enquanto se masturbavam. Os seus pais encontravam-nos, com uma toalha enrolada à volta do pescoço, a toalha amarrada no suporte de cabides do armário, e o garoto morto. Esperma por toda a parte. É claro que os pais limpavam tudo. Colocavam calças no garoto. Faziam parecer… melhor. Ao menos, intencional. Um caso comum de triste suicídio adolescente.
Outro amigo meu, um garoto da escola, o seu irmão mais velho na Marinha dizia como os soldados do Oriente Médio se masturbavam de forma diferente do que fazemos por aqui. Esse irmão tinha desembarcado num desses países cheios de camelos, onde o mercado público vendia o que pareciam abridores de carta chiques. Cada uma dessas coisas é apenas um fino cabo de latão ou prata polida, do comprimento aproximado da sua mão, com uma grande ponta numa das extremidades, ou uma esfera de metal ou uma dessas empunhaduras como as de espadas. Esse irmão da Marinha dizia que os árabes ficavam com ereção e inseriam esse cabo de metal dentro e por toda a extremidade dos seus pénis. Eles então masturbavam-se com o cabo dentro, e isso os fazia sentir mais prazer. De forma mais intensa.
Esse irmão mais velho viajava pelo mundo, mandando frases em francês. Frases em russo. Dicas de punhetagem.
Depois disso, o irmão mais novo, um dia ele não aparece na escola. Naquela noite, ele telefona-me a pedir que eu indique os seus trabalhos de casa para as próximas semanas. Porque ele está no hospital.
Ele tem que compartilhar um quarto com velhos que estiveram operando as entranhas. Ele diz que todos compartilham a mesma televisão. Que a única coisa para dar privacidade é uma cortina. Os seus pais não o vêm visitar. Ao telefone, ele diz como os pais dele queriam matar o irmão mais velho da Marinha.
Pelo telefone, o garoto diz que, no dia anterior, ele estava meio perturbado. Em casa, no seu quarto, ele deitou-se na cama. Ele estava a acender uma vela e folheva algumas revistas pornográficas antigas, preparando-se para se masturbar. Isso foi depois que ele recebeu as notícias do seu irmão marinheiro. Aquela dica de como os árabes se masturbam. O garoto olha ao redor procurando por algo que possa servir. Uma caneta é grande demais. Um lápis, grande demais e áspero. Mas escorrendo pelo canto da vela havia um fino filete de vela derretida que poderia servir. Com as pontas dos dedos, o garoto descola o filete da vela. Ele enrola -o na palma das suas mãos. Longo, e liso, e fino.
Excitado e com tesão, ele enfia lá dentro, mais e mais fundo por dentro do canal urinário do seu pénis. Com uma boa parte da cera ainda para fora, ele começa o trabalho. Até mesmo nesse momento ele reconhece que esses árabes eram muito espertos.
Eles reinventaram a punheta. Deitado totalmente na cama, as coisas estão ficar tão boas que o garoto nem observa a filete de cera. Ele está quase...quando percebe que a cera não está mais lá.
O fino filete de cera entrou. Bem lá no fundo. Tão fundo que ele nem consegue sentir a cera dentro de seu pénis. Das escadas, a sua mãe grita, a dizer que está na hora de jantar. Ela diz para ele descer naquele momento. O garoto da cenoura e o garoto da cera eram pessoas diferentes, mas viviam basicamente a mesma vida.
Depois do jantar, as entranhas do garoto começam a doer. É cera, então ele imagina que ela vá derreter dentro dele e ele poderá mijar para fora. Agora as suas costas doem. Os seus rins. Ele não consegue ficar ereto corretamente.
O garoto falando pelo telefone do seu quarto de hospital, no fundo podem-se ouvir campainhas, pessoas gritando. Game shows.
Os raios-X mostram a verdade, algo longo e fino, dobrado dentro de sua bexiga. Esse longo e fino V dentro dele recolhe todos os minerais da sua urina. Está a ficar maior e mais espesso, recolhendo cristais de cálcio, está batendo lá dentro, rasgando a frágil parede interna da sua bexiga, bloqueando a urina. Os eus rins estão cheios. O pouco que sai do seu pénis é vermelho de sangue.
O garoto e os seus pais, a família inteira, olham aquela radiografia com o médico e as enfermeiras ali, um grande V de cera brilha na chapa para todos verem, ele deve falar a verdade. Sobre o jeito que os árabes se masturbam. Sobre o que o seu irmão mais velho da Marinha escreveu.
Ao telefone, nesse momento, ele começa a chorar.
Eles pagam a operação à bexiga com o dinheiro da poupança para sua faculdade. Um erro estúpido, e agora ele nunca mais será um advogado. Enfiando coisas dentro de você. Enfiando-se dentro de coisas. Uma vela no seu pénis ou no seu pescoço num nó, sabíamos que não poderia acabar em problemas.
O que me fez ter problemas, eu chamava de Pesca Submarina: bater punheta de baixo d’água, sentado no fundo da piscina dos meus pais. Sustendo a respiração, mergulhava até o fundo da piscina e tirava os meus calções. Sentava-me no fundo por dois, três, quatro minutos. Só de bater punheta eu tinha conseguido uma enorme capacidade pulmonar. Se eu tivesse a casa só para mim, eu faria isso a tarde toda. Depois que eu me vinha, o meu esperma ficava a boiar em grandes e gordas gotas. Depois disso eram mais alguns mergulhos, para apanhar todas elas. Para as apanhar todas e as colocar numa toalha. Por isso se chamava de Pesca Submarina. Mesmo com o cloro, havia a minha irmã para se preocupar. Ou, Cristo, minha mãe.
Esse era meu maior medo: a minha irmã adolescente e virgem, pensava que estava a ficar gorda e dava à luz a um bebé retardado de duas cabeças. As duas se pareciam comigo. Eu, o pai e o tio. No fim, são as coisas com as quais não se preocupa que te prejudicam. A melhor parte da Pesca Submarina era o da bomba do filtro. A melhor parte era ficar nu e sentar em cima dela. Como os franceses dizem, Quem não gosta de ter seu cu chupado? Mesmo assim, num minuto você é só um garoto batendo uma, e no outro nunca mais será um advogado.
Num minuto eu estou no fundo da piscina e o céu é um azul claro e ondulado, aparecendo através de dois metros e meio de água sobre minha cabeça. Silêncio total exceto pelas batidas do coração que escuto no meu ouvido. Meu calção amarelo-listrado preso em volta do meu pescoço por segurança, só em caso de algum amigo, um vizinho, alguém que apareça e pergunte porque faltei aos treinos de futebol. O constante chupar da saída de água me envolve enquanto delicio meu rabo magro e branquela naquela sensação.
Num momento eu tenho ar o suficiente e meu falo está na minha mão. Os meus pais estão no trabalho e a minha irmã no balê. Ninguém estará em casa durante horas.
As minhas mãos começam a punhetar, e eu paro. Eu subo para respirar. Afundo e sento –me. Faço isso de novo, e de novo.
Deve ser por isso que as raparigas se querem sentar na sua cara. A sucção é como dar uma cagada que nunca acaba. O meu pénis duro e o meu cu a serem chupados, eu não preciso de mais ar. O bater do meu coração nos ouvidos, eu fico no fundo até as brilhantes estrelas de luz começarem a surgir nos meus olhos. As minhas pernas esticadas, a batata das pernas esfregando-se contra o fundo. O meus dedos do pé ficam azuis, os meus dedos ficam enrugados por estar tanto tempo na água.
E então acontece. As gotas gordas de gozo aparecem. É nesse momento que preciso de mais ar. Mas quando tento sair do fundo, não consigo. Não consigo colocar meus pés abaixo de mim. O meu rabo está preso.
Os médicos do serviço de emergência podem confirmar que todos os anos cerca de 150 pessoas ficam presas dessa forma, sugadas pelo filtro de piscina. Fique com o cabelo preso, ou o traseiro, e pode-se afogar. Todos os anos , muita gente fica. A maioria na Flórida.
As pessoas simplesmente não falam sobre isso. Nem mesmo os franceses que falam sobre tudo. Colocando um joelho no fundo, colocando um pé abaixo de mim, eu empurro contra o fundo. Estou a sair, não mais sentado no fundo da piscina, mas não estou chegando para fora da água também.
Ainda a nadar , mexo os meus dois braços, eu devo estar na metade do caminho para a superfície mas não estou indo mais longe que isso. O bater do meu coração no meu ouvido fica mais alto e mais forte.
As brilhantes fagulhas de luz passam pelos meus olhos, e eu olho para trás… mas não faz sentido. Uma corda espessa, algum tipo de cobra, branco-azulada e cheia de veias, saiu do fundo da piscina e prende o meu rabo. Algumas das veias estão a sangrar, sangue vermelho que aparenta ser preto debaixo da água, que sai por pequenos cortes na pálida pele da cobra. O sangue começa a sumir na água, e dentro da pele fina e branco-azulada da cobra é possível ver pedaços de alguma refeição semidigerida.
Só há uma explicação. Algum horrível monstro marinho, uma serpente do mar, algo que nunca viu a luz do dia, estava escondida no fundo escuro do duto da piscina, à espera para me comer.
Então… eu chuto a coisa, chuto a pele enrugada e escorregadia cheia de veias, e parece que mais está a sair do cano. Deve ser do tamanho da minha perna nesse momento, mas ainda segura com firmeza o meu cu. Com outro pontapé, estou a centímetros de conseguir respirar. Ainda sinto a cobra presa no meu rabo, estou bem próximo de escapar.
Dentro da cobra, é possível ver milho e amendoins. E dá pra ver uma brilhante esfera laranja. É um daqueles tipos de vitamina que meu pai me força a tomar, para poder ganhar massa. Para conseguir a bolsa como jogador de futebol. Com ferro e ácidos ómega 3.
Ver essa pílula foi o que me salvou a vida. Não é uma cobra. É o meu intestino grosso e o meu cólon a serem puxados para fora de mim. O que os médicos chamam de prolapso do reto. São as minhas entranhas a ser sugadas pelo duto.
Os médicos do serviço de emergência podem confirmar que uma bomba de piscina pode puxar 300 litros de água por minuto. Isso corresponde a 180 quilos de pressão. O grande problema é que somos todos interconectados por dentro. O seu rabo é apenas o fim da sua boca. Se eu deixasse, a bomba continuaria a puxar as minhas entranhas até chegar à língua. Imagine cagar 180 quilos e vai perceber como isso pode acontecer.
O que eu posso dizer é que as suas entranhas não sentem tanta dor. Não da forma que a sua pele sente dor. As coisas que você digere, os médicos chamam de matéria fecal. No meio disso tudo está o suco gástrico, com pedaços de milho, amendoins e ervilhas.
Essa sopa de sangue, milho, merda, esperma e amendoim flutua ao meu redor. Mesmo com as minhas entranhas a sair pelo rabo, eu tento segurar o que restou, mesmo assim, a minha vontade é de colocar os meus calções de alguma forma.
Deus proíba que os meus pais vejam o meu pénis.
Com uma mão seguro a saída do meu rabo, com a outra mão puxo o calção amarelo-listrado do meu pescoço. Mesmo assim, é impossível puxar .
Se quer sentir como seria tocar nos seus intestinos, compre um preservativo feito com intestino de carneiro. Pegue uma e desenrole. Encha de manteiga de amendoim. Lubrifique e coloque debaixo d’água. Então tente rasgá-la. Tente partir em duas. É firme e ao mesmo tempo macia. É tão escorregadia que não dá para segurar.
Um preservativo desses é feito do bom e velho intestino.
Então vê contra o que eu lutava.
Se eu largo, sai tudo.
Se eu nado para a superfície, sai tudo.
Se eu não nadar, afogo -me.
É escolher entre morrer agora, e morrer dentro de um minuto.
O que meus pais vão encontrar depois do trabalho é um feto grande e pelado, todo curvado. Mergulhado na água turva da piscina de casa. Preso ao fundo por uma larga corda de veias e entranhas retorcidas. O oposto do garoto que se estrangula enquanto bate uma. Esse é o bebé que trouxeram para casa do hospital há 13 anos. Esse é o garoto que esperavam conseguir uma bolsa de jogador de futebol e eventualmente um mestrado. Que cuidaria deles quando estivessem velhinhos. Os seus sonhos e esperanças. Flutuando aqui, pelado e morto. Em volta dele, gotas gordas de esperma.
Ou isso, ou os meus pais encontar-me-iam enrolado numa toalha encharcada de sangue, morto entre a piscina e o telefone da cozinha, os restos destroçados das minhas entranhas para fora do meu calção amarelo-listrado.
Algo sobre o que nem os franceses falam. Aquele irmão mais velho na Marinha, ele ensinou uma outra expressão divertida. Uma expressão russa. Do jeito que nós falamos “Preciso disso como preciso de um buraco na cabeça…”, os russos dizem, “Preciso disso como preciso de dentes no meu cu…”
Mne eto nado kak zuby v zadnitse.
Essas histórias de como animais presos em armadilhas roem a própria perna fora, bem, qualquer coiote te poderá confirmar que algumas mordidas são melhores que morrer.
Droga… mesmo se for russo, um dia vai querer esses dentes.
Senão, o que você pode fazer é curvar-se todo. Coloca um cotovelo por baixo do joelho e puxa essa perna para o seu rosto. Morde e rói o seu próprio cu. Se ficar sem ar consegue roer qualquer coisa para poder respirar de novo.
Não é algo que seja bom contar a uma rapariga no primeiro encontro. Não se espera por um beijinho de despedida. Se eu contasse como é o gosto, vocês não comeriam mais frutos do mar.
É difícil dizer o que enojaria mais os meus pais: como entrei nessa situação, ou como me salvei. Depois do hospital,a minha mãe dizia, “ Não sabiaS o que estavas a fazer, querido. EstavaS em choque.” E ela teve que aprender a cozinhar ovos …
Todas aquelas pessoas enojadas ou sentir pena de mim…
Precisava disso como precisaria de dentes no cu.
Hoje em dia, as pessoas costumam dizer-me que eu sou magrinho demais. As pessoas em jantares ficam quietas ou irritadas quando não como o cozido que fizeram. Cozidos podem -me matar. Presuntadas. Qualquer coisa que fique mais que algumas horas dentro de mim, sai ainda como comida. Feijões caseiros ou atum, eu levanto e encontro aquilo intacto na sanita.
Depois que passa por uma lavagem estomacal superrradical como esta, não digere carne tão bem. A maioria das pessoas tem um metro e meio de intestino grosso. Eu tenho sorte de ainda ter quinze centímetros. Então nunca consegui a minha bolsa de jogador de futebol. Nunca consegui o meu mestrado. Os meus dois amigos, o da cera e o da cenoura, eles cresceram, ficaram grandes, mas eu nunca pesei mais do que pesava aos 13 anos.
Outro problema foi que os meus pais pagaram muita dinheiro por aquela piscina. No fim , o meu pai teve que falar para o homem da limpeza da piscina que tinha sido um cachorro. O cachorro da família caiu e afogou -se. O corpo foi sugado pelo duto. Mesmo depois que o homem da limpeza abriu o filtro e removeu um tubo pegajoso, um pedaço molhado de intestino com uma grande vitamina laranja dentro, mesmo assim o meu pai dizia, “Aquele cachorro era maluco.”
Mesmo do meu quarto no segundo andar, podia ouvir o meu pai falar, “Não dava para deixar aquele cachorro sozinho por um segundo…”
E então a menstruação da minha irmã atrasou.
Mesmo depois de terem mudado a água da piscina, depois de termos vndido a casa e ido para outro estado, depois do aborto da minha irmã, mesmo depois de tudo isso , os meus pais nunca mencionaram tal coisa novamente.
Nunca.
Essa é a nossa cenoura invisível.
Agora pode respirar.
Eu ainda não.
Não achou nada de especial, não vai procurar ajuda psiquiátrica nem vai começar a escrever. Unicamente, perante estra amostra, decidiu não encomendar nenhum livro de chuck palahniuk...
Onicofagia...Gosta tanto de roer as unhas. Quando roi as unhas, não pensa em mais nada, a não ser em roer as unhas e roer as unhas dá um qualquer sentido à existência. Onicofagia, diz a wikipédia, é o hábito de roer as unhas, durante períodos de nervosismo, ansiedade, fome ou tédio. Também pode ser um sinal de desordens mentais ou emocionais. As crianças começam a roer as unhas por volta dos quatro ou cinco anos de idade. Com ela nada bate certo: assim que teve o primeiro dentinho, dizem, passava, meticulosamente todos os dedos pelo único exemplar, o que provará a sua precoce tendência para ensaios onicofágicos. Não lhe parece que os seus ataques roedores sejam desencadeados por situações de ansiedade ou de nervosismo: gosto de roer as unhas com método e com serenidade. Não é um impulso que não controle, é, sempre foi, uma procura de prazer. Aliás a afirmação convicta "roo porque me apetece e porque gosto" valeu-lhe,no passado, tantos tafebes da entidade maternal que decidi nunca roer à frente de quem quer que fosse. Esta circunstância fez com que interiorizasse afetivamente o vício, tornando-o num dos seus prazeres mais secretos e inconfessáveis, mas intimamente assumido. Será "sinal de desordens mentais ou emocionais"? Talvez. Mas haverá alguém totalmente ordenado mental e emocionalmente? Tal como se isola para pensar, para escrever e para ler, isola-se para roer as unhas. Quem planifica o ato de roer, revestindo-o de uma espécie de ritual quase sagrado- pode o Freud encontrar as explicações que lhe apetecer- mas não diga que a sua onicofagia é reveladora de nervosismo. Se as roedelas fossem determinadas por momentos de tédio, já não tinha unhas nem dedos nem mãos nem braços... Regressa à afirmação ,talvez não fundamentada, típica da rebeldia da adolescência: "roi porque lhe apetece e porque gosta"... A decisão de ter deixado de roer as unhas( decidiu e conseguiu, o que prova o seu controle sobre o impulso roedor)tem contornos interessantes...Para já só constato que toda a gente sempre fez a óbvia constatação de que eu roía as unhas, mas ninguém reparou que deixou de as roer, exceto,naturalmente, a dona manicure, exímia mentora espiritual neste processo ... Voltou a roer as unhas nuna crise de ansiedade...Apeteceu-lhe, talvez não o deixe de fazer...
All the wine is all for...you.
Beber a vida num trago, e nesse trago Todas as sensações que a vida dá Em todas as suas formas, boas, más, Trabalhos e prazeres, e ofícios, Todos lugares, viagens, explorações Crimes, lascívias, decadências todas.(...) Quero Afogar em bulício, em Luz, em vozes, — Tumultuárias coisas usuais (O sentimento da desolação Que me enche e me avassala. Folgaria De encher num dia, numa hora, num trago A medida dos vícios ainda mesmo Que fosse condenado eternamente ( Loucura — ao tal inferno. A um inferno real) .
Não só vinho, mas nele o olvido, deito Na taça: serei ledo, porque a dita É ignara. Quem, lembrando Ou prevendo, sorrira? Dos brutos, não a vida, senão a alma, Consigamos, pensando; recolhidos No impalpável destino Que não espera nem lembra. Com mão mortal elevo à mortal boca Em frágil taça o passageiro vinho, Baços os olhos feitos Para deixar de ver.
Febre! Febre! Estou trémulo de febre E de delírio, e ainda assim é grato Tudo isto a não sei que se passa Sem propósito de passar e... não, não, não... Fiquei fingindo que fujo... Fugirei... Onde estou? O que foi? que faço aqui? nArde-me a alma toda, arde-me arde Como uma cousa que arde.
MENSAGEM AO DIABO
É preciso criar abismos, para a humanidade que os não sabe saltar se engolfar neles para sempre.Criar todos os prazeres, os mais artificiais possível, os mais estúpidos possível, para que a chama atraia e queime.O problema da sobrepovoação, o problema da sobreprodução eliminam-se criando-se focos de eliminação humana (por meio de todos os vícios), criando focos de inércia humana (por meio de todas as seduções). Fazer suicidas, eis a grande solução sociológica.É facil ouvir de qualquer megera limpa que «não crê na Lei de Cristo», é animá-la em seguir a não-lei de Cristo. Em três anos está gasta e finda, e então descobre que o pior de não seguir a lei de Cristo é que os outros a não seguem também. E o caixote do lixo recebe-a como às teorias dos mestres a quem ela ensinou.É nosso dever de sociólogos untar o chão, ainda que seja com lágrimas, para que escorreguem nele os que dançam.E comunistas, batonnières dos beiços, humanitários, cultos do internacionalismo - tudo isso colabora ardentemente na eliminação deles mesmos que se precisa. Depois, dos recantos das províncias, onde tomam chá com a família, ou lavram as terras sem teorias nem desejos, os fortes surgem e a civilização continua.Porque sempre a Realidade é um bocado de sol simples, um quintal herdado e a certeza de ser um indivíduo. Não são as paredes reles do meu quarto vulgar, nem as secretárias velhas do escritório alheio, nem a pobreza das ruas intermédias da Baixa usual, tantas vezes por mim percorridas que já me parecem ter usurpado a fixidez da irreparabilidade, que formam no meu espírito a náusea, que nele é frequente, da quotidianidade enxovalhante da vida. São as pessoas que habitualmente me cercam, são as almas que, desconhecendo-me, todos os dias me conhecem com o convívio e a fala, que me põem na garganta do espírito o nó salivar do desgosto físico. E a sordidez monótona da sua vida, paralela à exterioridade da minha, é a sua consciência íntima de serem meus semelhantes, que me veste o traje de forçado, me dá a cela de penitenciário, me faz apócrifo e mendigo.Há momentos em que cada pormenor do vulgar me interessa na sua existência própria, e eu tenho por tudo a afeição de saber ler tudo claramente. Então vejo — como Vieira disse que Sousa descrevia — o comum com singularidade, e sou poeta com aquela alma com que a crítica dos gregos formou idade intelectual da poesia. Mas também há momentos, e um é este que me oprime agora, em que me sinto mais a mim que às coisas externas, e tudo se me converte numa noite de chuva e lama, perdido na solidão de um apeadeiro de desvio, entre dois comboios de terceira classe.Sim, a minha virtude íntima de ser frequentemente objectivo, e assim me extraviar de pensar-me, sofre, como todas as virtudes, e até como todos os vícios, decréscimos de afirmação. Então pergunto a mim mesmo como é que me sobrevivo, como é que ouso ter a cobardia de estar aqui, entre esta gente, com esta igualdade certeira com eles, com esta conformação verdadeira com a ilusão de lixo de eles todos? Ocorrem-me com um brilho de farol distante todas as soluções com que a imaginação é mulher — o suicídio, a fuga, a renúncia, os grandes gestos da aristocracia da individualidade, o capa e espada das existências sem balcão.Mas a Julieta ideal da realidade melhor fechou sobre o Romeu fictício do meu sangue a janela alta da entrevista literária. Ela obedece ao pai dela; ele obedece ao pai dele. Continua a rixa dos Montecchios e dos Capuletos; cai o pano sobre o que não se deu; e eu recolho a casa — àquele quarto onde é sórdida a dona de casa que não está lá, os filhos que raras vezes vejo, a gente do escritório que só verei amanhã — com a gola de um casaco de empregado do comércio erguida sem estranhezas sobre o pescoço de um poeta, com as botas compradas sempre na mesma casa evitando inconscientemente os charcos da chuva fria, e um pouco preocupado, misturadamente, de me ter esquecido sempre do guarda-chuva e da dignidade da alma.
Se, ao menos, acreditasse no diabo...
Bocas roxas de vinho
Testas brancas sob rosas,
Nus, brancos antebraços
Deixados sobre a mesa:
Tal seja, Lídia, o quadro
Em que fiquemos, mudos,
Eternamente inscritos
Na consciência dos deuses.
Antes isto que a vida
Como os homens a vivem,
Cheia da negra poeira
Que erguem das estradas.
Só os deuses socorrem
Com seu exemplo aqueles
Que nada mais pretendem
Que ir no rio das coisas.
Pensar-te e pensar-me é, afinal, o meu único vício.Como gostaria de só desejar " ir no rio das coisas"...
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