Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

sábado, 8 de julho de 2017

Cemitérios ...



Hoje já não faço anos. Duro.



Je pense que ma vie est d'une grande importance, mais je pense aussi qu'elle est dénuée de sens.

O que significa ser contemporâneos?. (…) Em 1874,Friedrich Nietzsche, um jovem filólogo que havia trabalhado até então em textos gregos e, dois anos antes, havia alcançado uma celebridade imprevista com “A origem da tragédia”, publica as“Considerações Intempestivas”, com as quais quer acertar contas com o seu tempo, tomar posição em relação ao presente. “Intempestiva é essa consideração”, lê-se no começo da segunda Consideração, “porque tenta entender como um mal, um inconveniente e um defeito algo do qual a época justamente se sente orgulhosa, ou seja, a sua cultura histórica, porque penso que todos somos devorados pela febre da história e deveríamos, pelo menos, dar-nos conta disso”. Pertence realmente ao seu tempo, é verdadeiramente contemporâneo aquele que não coincide perfeitamente com aquele, nem se adequa às suas pretensões e é, portanto, nesse sentido, inatual. Mas, justamente por isso, a partir desse afastamento e desse anacronismo, é mais capaz do que os outros de perceber e de apreender o seu tempo.Essa não-coincidência não significa, naturalmente, que seja contemporâneo quem vive numa outra era, um nostálgico que se sente mais cómodo na Atenas de Péricles, ou na Paris de Robespierre e do Marquês de Sade do que na cidade e no tempo em que lhe coube viver. Um homem inteligente pode odiar o seu tempo, mas sabe que irrevogavelmente lhe pertence, sabe que não pode fugir do seu tempo. A contemporaneidade é, pois, uma relação singular com o próprio tempo, que adere a este e, ao mesmo tempo, se distancia dele. Mais exatamente, é “essa relação com o tempo que adere a este, por meio de um desfasamento e de um anacronismo”. Os que coincidem de um modo excessivamente absoluto com a época, que concordam perfeitamente com ela, não são contemporâneos, porque, justamente por essa razão, não conseguem vê-la, não podem manter o seu olhar fixo nela.

O relógio que está para trás, na casa deserta, porque todos dormem, deixa cair lentamente o quádruplo som claro das quatro horas de quando é noite. Não dormi ainda, nem espero dormir. Sem que nada me detenha a atenção, e assim não durma, ou me pese no corpo, e por isso não sossegue, jaz na sombra, que o luar vago dos candeeiros da rua torna ainda mais desacompanhada, o silêncio amortecido do meu corpo estranho. Nem sei pensar, do sono que tenho; nem sei sentir, do sono que não consigo ter.

Desperto de sonhar-te Quando inda a noite é funda, E um céu estelar faz parte Do silêncio que inunda. Perdi poder amar-te E a treva me circunda. Talvez que relembrasse, Sonhando-te, outro ser, E aquilo que sonhasse Fosse tornar a ter. Mas despertei, e faz-se Claro em meu quarto a ver. Insónia de perder-te! Quem foste já não sei. Pela janela verte Cada astro a sua lei. Como, sem sonhar ter-te?... Porque não dormirei?

Dorme, criança, dorme,
Dorme que eu velarei;
A vida é vaga e informe,
O que não há é rei.
Dorme, criança, dorme,
Que também dormirei


Ah, não poder dormir (eu não sei como, Não na verdade o quero) eternamente, Acabar não comigo, nem com isto, Mas com tudo, causa, efeito, ser... Ideias vãs que a imaginação Vazia dum momento em quietude Gera sem ilusão, como criança Embriagando-se indolentemente Do cheiro transitório duma flor.

Estou cansado, tenho de tentar descansar e dormir, senão estou perdido em todos os aspetos. Que esforço manter-se uma pessoa viva. Erguer um monumento não exige que se gaste tanta força.


Doctor Strange is always changing siz And it's high time Cymbaline It's high time Cymbaline Please wake me...
De repente, como se um destino médico me houvesse operado de uma cegueira antiga com grandes resultados súbitos, ergo a cabeça, da minha vida anónima, para o conhecimento claro de como existo. E vejo que tudo quanto tenho feito, tudo quanto tenho pensado, tudo quanto tenho sido, é uma espécie de engano e de loucura. Tudo quanto tenho feito, pensado, sido, é uma soma de subordinações, ou a um ente falso que julguei meu, por que agi dele para fora, ou de um peso de circunstâncias que supus ser o ar que respirava. Sou, neste momento de ver, um solitário súbito, que se reconhece desterrado onde se encontrou sempre cidadão. No mais íntimo do que pensei não fui eu.
É tão difícil descrever o que se sente quando se sente que realmente se existe, e que a alma é uma entidade real, que não sei quais são as palavras humanas com que possa defini-lo. Não sei se estou com febre, como sinto, se deixei de ter a febre de ser dormidor da vida. Sim, repito, sou como um viajante que de repente se encontre numa vila estranha sem saber como ali chegou; e ocorrem-me esses casos dos que perdem a memória e são outros durante muito tempo. Fui outro durante muito tempo — desde a nascença e a consciência —, e acordo agora no meio da ponte, debruçado sobre o rio, e sabendo que existo mais firmemente do que fui até aqui. Mas a cidade é-me incógnita, as ruas novas, e o mal sem cura. Espero, pois, debruçado sobre a ponte, que me passe a verdade, e eu me restabeleça nulo e fictício, inteligente e natural. Foi só um momento, e vi-me. Depois já não sei sequer dizer o que foi. E, por fim, tenho sono, porque, não sei porquê, acho que o sentido é dormir.


Como a noite é longa! Toda a noite é assim... Senta-te, ama, perto Do leito onde esperto. Vem pr'ao pé de mim... Amei tanta coisa... Hoje nada existe... Era uma princesa Que amou... Já não sei... Como estou esquecido Que é feito de tudo? Que fiz eu de mim? Deixa-me dormir, Dormir a sorrir E seja isto o fim.

Posso dormir, porque é manhã em mim. E sinto a minha boca sorrir, deslocando levemente as pregas moles da fronha que me prende o rosto. Posso deixar-me a vida, posso dormir, posso ignorar-me... E, através do sono novo que me escurece, ou lembro o galo que cantou, ou é ele, de veras, que canta segunda vez...

Tenho principalmente não ter nada, Dormir seria sono se o tivesse... Meu ser vive na Noite e no Desejo. Minha alma é uma lembrança que há em mim...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho... )
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos ...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!


Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira! ...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...


I was doing fine without ya, 'til I saw your face, now I can't erase it Giving in to all this bullshit...

Feels like I only go backwards baby Every part of me says: Go ahead I got my hopes up again, oh no... not again...

Em Negra espalda del tiempo , javier marías constrói um mundo fantástico, alicerçado nos princípios da criação literária, desde a função do narrador e das suas categorías, passando pelos limites imprecisos da noção de género, até ao conceito de ficcionalidade, numa espécie de jogo sem limites que pode criar desconcerto e até desconforto ao leitor. É também uma novela que problematiza vida, no seu sentido mais amplo e universal: desde o nascimento até à morte, evidenciando o papel do destino e do tempo, por vezes jocoso, por vezes trágico, num jogo filosófico com raízes tanto literárias como reais. É uma novela difícil de classificar.

la palabra-incluso la hablada, incluso la más tosca-es en sí misma metafórica y por ello imprecisa [ ... ] Basta con que alguien introduzca un «como si» en su relato; aún más, basta con que haga un símil o una comparación o hable figuradamente [ ... ] para que la ficción se deslice en la narración de lo sucedido y lo altere o falsee. En realidad la vieja aspiración de cualquier cronista o superviviente, relatar lo ocurrido, dar cuenta de lo acaecido, dejar constancia de los hechos y delitos y hazañas, es una mera ilusión o quimera, o mejor dicho, la propia frase, ese propio concepto, son ya metafóricos y forman parte de la ficción. Relatar lo ocurrido» es inconcebible y vano, o bien es sólo posible como invención...


As características dos vícios são inumeráveis, mas o seu efeito apenas um: o descontentamento consigo próprio.

Nisto erramos: em ver a morte à nossa frente, como um acontecimento futuro, enquanto grande parte dela já ficou para trás. Cada hora do nosso passado pertence à morte.

Não é uma questão de morrer cedo ou tarde, mas de morrer bem ou mal. Morrer bem significa escapar vivo do risco de morrer doente.


Encontro entre dido e eneias, nos Infernos:

Logo que Eneias a reconheceu entre as sombras, como no início do mês se vê a Lua entre as nuvens, deixou correr as lágrimas e disse-lhe com doce amor: " ... juro pelas constelações, pelos deuses e por tudo o que há de mais sagrado nestas profundezas da terra: "foi contrariado, minha querida rainha, que abandonei as praias do teu reino. Não fiz mais que obedecer aos deuses(...)E não pude crer que a minha partida te causasse uma tão grande dor.
Pára ,não te furtes ao encontro do nosso olhar(...) É a última vez que o destino me permite que te fale."


O homem que não é sensível à música, que não se comove com a harmonia de doces sons, nasceu para as traições, os ardis, os roubos; Os movimentos do seu espírito são surdos como a noite, as suas afeições, tenebrosas como o Érebro: não se confie num homem assim. Ouçamos a música.

Se fazer fosse tão fácil quanto saber o que é preferível, as capelas seriam igrejas e as cabanas dos pobres, palácios de príncipes. O bom pregador é aquele que segue os seus próprios preceitos; para mim, acharia mais fácil ensinar a vinte pessoas o caminho do bem, do que ser uma dessas vinte pessoas e obedecer às minhas próprias recomendações.

É muito melhor viver sem felicidade do que sem amor. É preferível suportar os males que temos do que voar para aqueles que não conhecemos. O verdadeiro nome do amor é cativeiro. A mágoa altera as estações e as horas de repouso, fazendo da noite dia e do dia noite.

Baste a quem baste o que lhe basta O bastante de lhe bastar!


Tradução livre da carta de despedida de kurt cobain:

Falo como um homem simplório com experiência que obviamente preferia ser uma criança castrada e refilona. Este bilhete deve ser bastante fácil de entender. Todas as advertências das aulas de Introdução ao Punk Rock, ao longo dos anos, desde a minha apresentação à, digamos, ética envolvida na independência e o acolhimento da sua comunidade, se provaram verdadeiras. Eu não tenho sentido a excitação de ouvir, bem como de criar música, juntamente com a leitura e a escrita, há muitos anos. Sinto -me culpado por essas coisas além do que posso expressar em palavras.

Por exemplo, quando estamos atrás do palco e as luzes se apagam, e o ruído ensandecido da multidão começa, isso não me afeta do modo que afetava Freddie Mercury, que parecia gostar, deliciar -se com o amor e adoração da multidão, que é algo que, sinceramente, eu admiro e invejo. A verdade é que não vos consigo enganar , a nenhum de vocês. Simplesmente não é justo nem com vocês nem comigo. O pior crime que posso imaginar seria enganar as pessoas , sendo falso e fingindo como se eu me estivesse a divertir a 100%. Às vezes eu sinto como se tivesse de picar o ponto antes de subir ao palco. Eu tentei tudo ao meu alcance para gostar disso (e eu tento, por Deus, acreditem em mim, eu tento, mas não é o suficiente). Eu gosto do facto que eu e nós atingimos e divertimos um monte de gente. Devo ser um daqueles narcisistas que só dão valor as coisas quando elas se vão. Sou muito sensível. Preciso ficar um pouco dormente para ter de volta o entusiasmo que eu tinha quando criança. Nas nossas últimas três digressões, eu tive um apreço muito maior por todas as pessoas que conheci pessoalmente e pelos fãs da nossa música, mas eu ainda não consigo superar a frustração, a culpa e a empatia que eu tenho por todos. Existem coisas boas dentro de todos nós. Eu acho que simplesmente amo demais as pessoas e isso me deixa muito triste. O pequeno, sensível, insatisfeito, pisciano, Jesus triste. “E porque simplesmente não aproveita o momento ?” Eu não sei. Eu tenho uma deusa como esposa que transpira ambição e empatia e uma filha que me lembra demais como eu costumava ser, cheia de amor e alegria, beijando todas pessoas que ela encontra porque todos são bons e ninguém lhe fará mal nenhum. E isso apavora-me ao ponto de eu mal conseguir funcionar. Eu não posso suportar a idia de Frances se tornar um triste, autodestrutivo, e mortal roqueiro, como eu me tornei. Eu tive muito, muito mesmo, e sinto-me grato por isso, mas, desde os sete anos, passei a ter ódio de todos os homens em geral. Apenas porque parece tão fácil para as pessoas que sentem empatia darem -se bem. Apenas porque eu amo e lamento demais pelas pessoas, eu acho.

Obrigado do fundo do meu ardente e nauseado estômago pelas suas cartas e pela preocupação nestes últimos anos. Eu sou um bebé errático e triste! Eu não tenho mais a paixão, e por isso lembre-se, é melhor queimar de vez do que se apagar aos poucos.

Paz, amor, empatia.
Kurt Cobain


Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele.


Às 9:50, do dia 30 de novembro de 1900, oscar fingal o'flahertie wills wilde( sebastian melmoth) morre em paris...

Não tenho tempo para ser feliz, Sibyl.Gosto sempre da última pessoa que me foi apresentada; mas normalmente,assim que conheço as pessoas, farto-me delas.

Quando entraram, viram pendurado na parede um esplêndido retrato do seu amo, tal qual ultimamente ele era, com toda a maravilha da sua juventude e requintada beleza. No soalho,jazia um homem morto, em fato de noite,com uma navalha espetada no coração. Tinha um rosto macilento, enrugado, repugnante. Só depois deterem examinado os anéis que trazia é que descobriram quem era.

No dia 30 de novembro de 1935, já quase sem voz, pediu os óculos e escreveu a última frase: "I know not what tomorrow will bring"...

Quando vier a Primavera, Se eu já estiver morto, As flores florirão da mesma maneira E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada. A realidade não precisa de mim. Sinto uma alegria enorme Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.


A morte é uma libertação porque morrer é não precisar de outrem. O pobre escravo vê-se livre à força dos seus prazeres, das suas mágoas, da sua vida desejada e contínua. Vê-se livre o rei dos seus domínios, que não queria deixar. As que espalharam amor vêem-se livres dos triunfos que adoram. Os que venceram vêem-se livres das vitórias para que a sua vida se fadou. Por isso a morte enobrece, veste de galas desconhecidas o pobre corpo absurdo. É que ali está um liberto, embora o não quisesse ser. É que ali não está um escravo, embora ele chorando perdesse a servidão. Como um rei cuja maior pompa é o seu nome de rei, e que pode ser risível como homem, mas como rei é superior, assim o morto pode ser disforme, mas é superior, porque a morte o libertou.

Agora que os dedos da Morte à roda da minha garganta
Sensivelmente começam a pressão definitiva...
E que tomo consciência exorbitando os meus olhos,
Olho p'ra trás de mim, reparo pelo passado fora
Vejo quem fui, e sobretudo quem não fui
Considero lucidamente o meu passado misto
E acho que houve um erro
Ou em eu viver ou em eu viver assim.
Será sempre que quando a Morte me entra no quarto
E fecha a porta a chave por dentro,
E a coisa é definitiva, inabalável,
Sem Cour de cassation para o meu destino findo,
Será sempre que, quando a meia-noite soa na vida
Uma exasperação de calma, uma lucidez indesejada
Acorda como uma coisa anterior à infância no meu partir?
Último arranco, extenuante clarão, de chama que a seguir se apaga
Frio esplendor do fogo de artifício antes da cinza completa,
Trovão máximo sobre as nossas cabeças, por onde
Se sabe que a trovoada, por estar [...], decresceu.
Viro-me para o passado.
Sinto-me ferir na carne.
Olho com essa espécie de alegria da lucidez completa
Para a falência instintiva que houve na minha vida
Vão apagar o último candeeiro
Na rua amanhecente de minha Alma!
Sinal de [..]
O último candeeiro que apagam!
Mas antes que eu veja a verdade, pressinto-a
Antes que a conheça, amo-a.
Viro-me para trás, para o passado, não [visiono? ];
Olho e o passado é uma espécie de futuro para mim.
Mestre, Alberto Caeiro, que eu conheci no princípio
E a quem depois abandonei como um espantalho reles,
Hoje reconheço o erro, e choro dentro de mim,
Choro com a alegria de ver a lucidez com que choro
E embandeiro em arco à minha morte e à minha falência sem fim,
Embandeiro em arco a descobri-la, só a saber quem ela é.
Ergo-me em fim das almofadas quase cómodas
E volto ao meu remorso sadio...


so worry not all things are well we’ll be alright we have our looks and perfume on...


I see your face in all my dreams, But I guess I never understood exactly what it means. I wake up feeling sorry, never know what for, Moping up the stairs and slowly walking out the door on my own...

Mandado de despejo aos mandarins da Europa! Fora. Fora tu , Anatole France , Epicuro de farmacopeia homeopática, tenia-Jaurès do Ancien Régime, salada de Renan-Flaubert em loiça do século dezassete, falsificada! Fora tu, Maurice Barrès, feminista da Acção, Châteaubriand de paredes nuas, alcoviteiro de palco da pátria de cartaz, bolor da Lorena, algibebe dos mortos dos outros, vestindo do seu comércio ! Fora tu, Bourget das almas, lamparineiro das partículas alheias, psicólogo de tampa de brasão, reles snob plebeu, sublinhando a régua de lascas os mandamentos da lei da Igreja! Fora tu, mercadoria Kipling, homem-prático do verso, imperialista das sucatas, épico para Majuba e Colenso, Empire-Day do calão das fardas, tramp-steamer da baixa imortalidade ! Fora ! Fora ! Fora tu, George Bernard Shaw, vegeteriano do paradoxo, charlatão da sinceridade, tumor frio do ibsenismo, arranjista da intelectualidade inesperada, Kilkenny-Cat de ti próprio, Irish Melody calvinista com letra da Origem das Espécies! Fora tu, H. G. Wells, ideativo de gesso, saca-rolhas de papelão para a garrafa da Complexidade ! Fora tu, G. K. Chesterton, cristianismo para uso de prestidigitadores, barril de cerveja ao pé do altar, adiposidade da dialéctica cockney com o horror ao sabão influindo na limpeza dos raciocínios ! Fora tu, Yeats da céltica bruma à roda de poste sem indicações, saco de podres que veio à praia do naufrágio do simbolismo inglês! Fora ! Fora ! Fora tu, Rapagnetta-Annunzio, banalidade em caracteres gregos, «D. Juan em Patmos» (solo de trombone)! E tu, Maeterlinck, fogão do Mistério apagado! E tu, Loti, sopa salgada, fria! E finalmente tu, Rostand-tand-tand-tand-tand-tand-tand-tand! Fora! Fora! Fora! E se houver outros que faltem, procurem-nos aí para um canto! Tirem isso tudo da minha frente! Fora com isso tudo! Fora! Aí ! Que fazes tu na celebridade, Guilherme Segundo da Alemanha, canhoto maneta do braço esquerdo, Bismarck sem tampa a estorvar o lume ?!Quem és tu, tu da juba socialista, David Lloyd George, bobo de barrete frígio feito de Union Jacks?!
E tu, Venizelos, fatia de Péricles com manteiga, caída no chão de manteiga para baixo?!
E tu, qualquer outro, todos os outros, açorda Briand-Dato-Boselli da incompetência ante os factos, todos os estadistas pão-de-guerra que datam de muito antes da guerra! Todos! todos! todos! Lixo, cisco, choldra provinciana, safardanagem intelectual!
E todos os chefes de estado, incompetentes ao léu, barris de lixo virados pra baixo à porta da Insuficiência da Época!
Tirem isso tudo da minha frente!
Arranjem feixes de palha e ponham-nos a fingir gente que seja outra!
Tudo daqui para fora! Tudo daqui para fora!
Ultimatum a eles todos, e a todos os outros que sejam como eles todos!
Se não querem sair, fiquem e lavem-se !
Falência geral de tudo por causa de todos !
Falência geral de todos por causa de tudo !
Falência dos povos e dos destinos — falência total !
Desfile das nações para o meu Desprezo!
Tu, ambição italiana, cão de colo chamado César!
Tu, «esforço francês», galo depenado com a pele pintada de penas! (Não lhe dêem muita corda senão parte-se!)
Tu organização britânica, com Kitchener no fundo do mar desde o princípio da guerra!
(It's a long, long way to Tipperary, and a jolly sight longer way to Berlin !)
Tu, cultura alemã, Esparta podre com azeite de cristianismo e vinagre de nietzschização, colmeia de lata, transbordeamento imperialóide de servilismo engatado!
Tu, Áustria-súbdita, mistura de sub-raças, batente de porta tipo K!
Tu, Von Bélgica, heróica à força, limpa a mão à parede que foste!
Tu, escravatura russa, Europa de malaios, libertação de mola desoprimida porque se partiu!
Tu, «imperialimo» espanhol, salero em política, com toureiros de sambenito nas almas ao voltar da esquina e qualidades guerreiras enterradas em Marrocos !
Tu, Estados Unidos da America, síntese-bastardia da baixa-Europa, alho da aÁorda transatlântica, pronúncia nasal do modernismo inestético!
E tu, Portugal-centavos, resto de Monarquia a apodrecer República, extrema-unção-enxovalho da Desgraça, colaboração artificial na guerra com vergonhas naturais em África!
E tu, Brasil «república irmã», blague de Pedro Álvares Cabral, que nem te queria descobrir!
Ponham-me um pano por cima de .tudo isso!
Fechem-me isso à chave e deitem a chave fora!
Onde estão os antigos, as forças, os homens, os guias, os guardas?
Vão aos cemitérios, que hoje são só nomes nas lápides!
Agora a filosophia é o ter morrido Fouillée!
Agora a arte é o ter ficado Rodin!
Agora a literatura é Barrès significar!
Agora a crítica é haver bestas que não chamam besta ao Bourget!
Agora a política é a degeneração gordurosa da organização da incompetência!
Agora a religião é o catolicismo militante dos taberneiros da fé, o entusiasmo cozinha-franceza dos Maurras de razão-descascada, é a espectaculite dos pragmatistas cristãos, dos intuicionistas católicos, dos ritualistas nirvânicos, angariadores de anúncios para Deus !
Agora é a guerra, jogo do empurra do lado de cá e jogo de porta do lado de lá!
Sufoco de ter só isto à minha volta!
Deixem-me respirar!
Abram todas as janelas !
Abram mais janelas do que todas as janelas que há no mundo!
Nenhuma ideia grande, ou noção completa ou ambição imperial de imperador-nato!
Nenhuma ideia de uma estrutura, nenhum senso do Edifício, nenhuma ânsia do Orgânico-Criado!
Nem um pequeno Pitt, nem um Goethe de cartão, nem um Napoleão de Nürnberg!
Nem uma corrente literária que seja sequer a sombra do romantismo ao meio-dia!
Nem um impulso militar que tenha sequer o vago cheiro de um Austerlitz!
Nem uma corrente política que soe a uma ideia-grão, chocalhando-a, ó Caios Grachos de tamborilar na vidraça!
Época vil dos secundários, dos aproximados, dos lacaios com aspirações de lacaios a reis-lacaios!
Lacaios que não sabeis ter a Aspiração, burgueses do Desejo, transviados do balcão instintivo! Sim, todos vós que representais a Europa, todos vós que sois políticos em evidência em todo o mundo, que sois literatos meneurs de correntes europeias, que sois qualquer coisa a qualquer coisa neste maelström de chá-morno!
Homens-altos de Lilliput-Europa, passai por baixo do meu Desprezo ! Passai vós, ambiciosos do luxo quotidiano, anseios de costureiras dos dois sexos, vós cujo tipo é o plebeu Annunzio, aristocrata de tanga de ouro!
Passai vós, que sois autores de correntes artísticas, verso da medalha da impotência de criar!
Passai, frouxos que tendes a necessidade de serdes os istas de qualquer ismo!
Passai, radicais do Pouco, incultos do Avanço, que tendes a ignorância por coluna da audácia, que tendes a impotência por esteio das neo-teorias!
Passai, gigantes de formigueiro, ébrios da vossa personalidade de filhos de burguês, com a mania da grande-vida roubada na dispensa paterna e a hereditariedade indesentranhada dos nervos!
Passai, mistos; passai, débeis que só cantais a debilidade; passai, ultra-débeis que cantais só a força, burgueses pasmados ante o atleta de feira que quereis criar na vossa indecisão febril !
Passai, esterco epileptóide sem grandezas, histerialixo dos espectáculos, senilidade social do conceito individual de juventude!
Passai, bolor do Novo, mercadoria em mau estado desde o cérebro de origem!
Passai à esquerda do meu Desdém virado à direita, criadores de «sistemas filosóficos», Boutroux, Bergsons, Euckens, hospitais para religiosos incuráveis, pragmatistas do jornalismo metafísico, lazzaroni da construção meditada!
Passai e não volteis, burgueses da Europa-Total, párias da ambição do parecer-grandes, provincianos de Paris!
Passai, decigramas da Ambição, grandes só numa época que conta a grandeza por centimiligramas!
Passai, provisórios, quotidianos, artistas e políticos estilo lightning-lunch, servos empoleirados da Hora, trintanários da Ocasião!
Passai, «finas sensibilidades» pela falta de espinha dorsal; passai, construtores de café e conferência, monte de tijolos com pretensões a casa!
Passai, cerebrais dos arrabaldes, intensos de esquina-de-rua!
Inútil luxo, passai, vã grandeza ao alcance de todos, megalomonia triunfante do aldeão de Europa-aldeia!
Vós que confundis o humano com o popular, e o aristocrático com o fidalgo! Vós que confundis tudo, que, quando não pensais nada, dizeis sempre outra coisa! Chocalhos, incompletos, maravalhas, passai!
Passai, pretendentes a reis parciais, lords de serradura, senhores feudais do Castelo de Papelão!
Passai, romantismo póstumo dos liberalões de toda a parte, classicismo em álcool dos fetos de Racine, dinamismo dos Whitmans de degrau de porta, dos pedintes da inspiração forçada, cabeças ocas que fazem barulho porque vão bater com elas nas paredes!
Passai, cultores do hipnotismo em casa, dominadores da vizinha do lado, caserneiros da Disciplina que não custa nem cria !
Passai, tradicionalistas auto-convencidos, anarquistas deveras sinceros, socialistas a invocar a sua qualidade de trabalhadores para quererem deixar de trabalhar! Rotineiros da revolução, passai!
Passai eugenistas, organizadores de uma vida de lata, prussianos da biologia aplicada, neo-mendelianos da incompreensão sociológica!
Passai, vegeterianos, teetotalers, calvinistas dos outros, kill-joys do imperialismo de sobejo!
Passai, amanuenses do «vivre sa vie» de botequim extremamente de esquina, ibsenóides Bernstein-Bataille do homem forte de sala de palco!
Tango de pretos, fosses tu ao menos minuete!
Passai, absolutamente, passai!
Vem tu finalmente ao meu Asco, roça-se tu finalmente contra as solas do meu Desdém, grand finale dos parvos, conflagração-escárneo, fogo em pequeno monte de estrume, síntese dinâmica do estatismo ingénito da Época!
Roça-te tu e rojate, impotência a fazer barulho!
Roça-te, canhões declamando a incapacidade de mais ambição que balas, de mais inteligência que bombas!
Que esta é a equação-lama da infâmia do cosmopolitismo de tiros:
JONNART
BÉLGICA
VON BISSING
GRÉCIA
Proclamem bem alto que ninguém combate pela liberdade ou pelo Direito!Todos combatem por medo dos outros ! Não tem mais metros que estes milímetros a estatura das suas direcções!
Lixo guerreiro-palavroso! Esterco Joffre-Hindenburguesco! Sentina europeia de Os Mesmos em excisão balofa!
Quem acredita neles?
Quem acredita nos outros?
Façam a barba aos poilus!
Descasquetem o rebanho inteiro!
Mandem isso tudo pra casa descascar batatas simbólicas!
Lavem essa celha de mixórdia inconsciente!
Atrelem uma locomotiva a essa guerra!
Ponham uma coleira a isso e vão exibi-lo para a Austrália!
Homens, nações, intuitos, está tudo nulo!
Falência de tudo por causa de todos! Falência de todos por causa de tudo! De um modo completo, de um modo total, de um modo integral:
MERDA!
A Europa tem sede de que se crie, tem fome de Futuro !
A Europa quer grandes Poetas, quer grandes Estadistas, quer grandes Generais !
Quer o Político que construa conscientemente os destinos inconscientes do seu povo !
Quer o Poeta que busque a Imortalidade ardentemente, e não se importe com a fama, que é para as actrizes e para os produtos farmacêuticos!
Quer o General que combata pelo Triunfo Construtivo, não pela vitória em que apenas se derrotam os outros!
A Europa quer muito destes Políticos, muitos destes Poetas, muitos destes Generais!
A Europa quer a Grande Ideia que esteja por dentro destes Homens Fortes — a ideia que seja o Nome da sua riqueza anónima!
A Europa quer a Inteligência Nova que seja a Forma da sua Mateira caótica!
Quer a Vontade Nova que faça um Edifício com as pedras-ao-acaso do que é hoje a Vida!
Quer a sensibilidade Nova que reúna de dentro os egoísmos dos lacaios da Hora!
A Europa quer Donos! O Mundo quer a Europa!
A Europa está farta de não existir ainda ! Está farta de ser apenas o arrabalde de si-própria ! A Era das Máquinas procura, tacteando, a vinda da Grande Humanidade!
A Europa anseia, ao menos, por Teóricos de O-que-será, por Cantores-Videntes do seu Futuro!
Dai Homeros À Era das Máquinas, ó Destinos científicos! Dai Miltons à época das Coisas Eléctricas, ó Deuses interiores à Matéria!
Dai-nos Possuidores de si-próprios, Fortes Completos, Harmónicos Subtis!
A Europa quer passar de designação geográfica a pessoa civilizada !
O que aí está a apodrecer a Vida, quando muito é estrume para o Futuro!
O que aí está não pode durar, porque não é nada!
Eu, da Raça dos Navegadores, afirmo que não pode durar!
Eu, da Raça dos Descobridores, desprezo o que seja menos que descobrir um Novo Mundo!
Quem há na Europa que ao menos suspeite de que lado fica o Novo Mundo agora a descobrir?
Quem sabe estar em um Sagres qualquer?
Eu, ao menos, sou uma grande Ânsia, do tamanho exacto do Possível!
Eu, ao menos sou da estatura da Ambição Imperfeita, mas da Ambição para Senhores, não para escravos!
Ergo-me ante, o sol que desce, e a sombra do meu Desprezo anoitece em vós!
Eu, ao menos, sou bastante para indicar o Caminho!
Vou indicar o caminho!
ATENÇÃO!
Proclamo, em primeiro lugar,
A Lei de Malthus da Sensibilidade
Os estímulos da sensibilidade aumentam em progressão geométrica; a própria sensibilidade apenas em progressão aritmética.
Compreende-se a importância desta lei. A sensibilidade — tomada aqui no mais amplo dos seus sentidos possíveis — é a fonte de toda a criação civilizada. Mas essa criação só pode dar-se completamente quando essa sensibilidade esteja adaptada ao meio em que funciona; na proporção da adaptação da sensibilidade ao meio está a grandeza e a força da obra resultante.
Ora a sensibilidade, embora varie um pouco pela influência insistente do meio actual, é, nas suas linhas gerais, constante, e determinada no mesmo indivíduo desde a sua nascença, função do temperamento que a hereditariedade lhe infixou. A sensibilidade, portanto, progride por gerações.
As criações da civilização, que constituem o «meio» da sensibilidade, são a cultura, o progresso científico, a alteração nas condições políticas (dando à expressão um sentido completo); ora estes ó e sobretudo o progresso cultural e científico, uma vez começado — progridem não por obra de gerações, mas pela interacção e sobreposição da obra de indivíduos, e, embora lentamente a princípio, breve progridem ao ponto de tomarem proporções em que, de geração a geração, centenas de alterações se dão nestes novos estímulos da sensibilidade, ao passo que a sensibilidade deu; ao mesmo tempo, só um avanço, que é o de uma geração, porque o pai não transmite ao filho senão uma pequena parte das qualidades adquiridas.
Temos, pois, que a uma certa altura da civilização há de haver uma desadaptação da sensibilidade ao meio, que consiste dos seus estímulos — uma falência portanto. Dá-se isso na nossa época, cuja incapacidade de criar grandes valores deriva dessa desadaptação.
A desadaptação não foi grande no primeiro período da nossa civilização, da Renascença ao século XVIII, em que os estímulos da sensibilidade eram sobretudo de ordem cultural, porque esses estímulos, por sua própria natureza, eram de progresso lento, e atingiam a princípio apenas as camadas superiores da sociedade.
Acentuou-se a desadaptação no segundo período, que parte da Revolução para o século XIX, e em que os estímulos são já sobretudo políticos, onde a progressão é facilmente maior e o alcance do estímulo muito mais vasto. Cresceu a desadaptação vertiginosamente no período desde meados do século XIX à nossa época, em que o estímulo, sendo as criações da ciência, produz já uma rapidez de desenvolvimento que deixa atrás os progressos da sensibilidade, e, nas aplicações práticas da ciência, atinge toda a sociedade. Assim se chega à enorme desproporção entre o termo presente da progressão geométrica dos estímulos da sensibilidade e o termo correspondente da progressão aritmética da própria sensibilidade.
Daí a desadaptação, a incapacidade criativa da nossa época. Temos, portanto, um dilema: ou morte da civilização, ou adaptação artificial, visto que a natural, a instinctiva faliu.
Para que a civilização não morra, proclamo, portanto em segundo lugar,
A Necessidade da Adaptação Artificial
O que é a adaptação artificial?
É um acto de cirurgia sociológica. É a transformação violenta da sensibilidade de modo a tornar-se apta a acompanhar pelo menos por algum tempo, a progressão dos seus estímulos.
A sensibilidade chegou a um estado mórbido, porque se desadaptou. Não há que pensar em curá-la. Não há curas sociais. Há que pensar em operá-la para que ela possa continuar a viver. Isto é, temos que substituir a morbidez natural da desadaptação pela sanidade artificial feita pela intervenção cirúrgica, embora envolva uma mutilação.
O que é que é preciso eliminar do psiquismo contemporâneo?
Evidentemente que é aquilo que seja a aquisição fixa mais recente no espírito — isto é, aquela aquisição geral do espírito humano civilizado que seja anterior ao estabelecimento da nossa civilização, mas recentemente anterior; e isto por três razões: (a) porque, por ser a mais recente das fixações psíquicas, é a menos difícil de eliminar; (b) porque, visto que cada civilização se forma por uma reacção contra a anterior, são os princípios da anterior que são os mais antagónicos à actual e que mais impedem a sua adaptação às condições especiais que durante esta apareçam; (c) porque, sendo a aquisição fixa mais recente, a sua eliminação não ferirá tão fundo a sensibilidade geral como o faria a eliminação, ou a pretensão de eliminar, qualquer fundo depósito psíquico.
Qual é a ultima aquisição fixa do espírito humano geral?
Deve ser composta de dogmas do cristianismo, porque a Idade Média, vigência plena daquele sistema religioso, precede imediatamente e duradouramente, a eclosão da nossa civilização, e os princípios cristãos são contraditados pelos firmes ensinamentos da ciência moderna.
A adaptação artificial será portanto espontanente feita desde que se faça uma eliminação das aquisições fixas do espírito humano, que derivam da sua mergência no cristianismo.
Proclamo, por isso, em terceiro lugar,
A intervenção cirúrgica anti-cristã
Resolve-se ela, como é de ver, na eliminação dos três preconceitos, dogmas, ou atitudes, que o cristianismo fez que se infiltrassem na própria substância da psique humana.
Mas qual o Método, o feitio da operação colectiva que há de organizar, nos homens do futuro, esses resultados? Qual o Método operatório inicial?
O Método sabe-o só a geração por quem grito por quem o cio da Europa se roça contra as paredes ! Se eu soubesse o Método, seria eu-próprio toda essa geração!
Mas eu só vejo o Caminho; não sei onde ele vai ter.
Em todo o caso proclamo a necessidade da vinda da Humanidade dos Engenheiros!
Faço mais: garanto absolutamente a vinda da Humanidade dos Engenheiros!
Proclamo, para um futuro próximo, a criação científica dos Super-homens!
Proclamo a vinda de uma Humanidade matemática e perfeita!
Proclamo a sua Vinda em altos gritos!
Proclamo a sua Obra em altos gritos!
Proclamo‑A, sem mais nada, em altos gritos!
E proclamo também: Primeiro:
O Super-homem será, não o mais forte, mas o mais completo!
E proclamo também: Segundo:
O Super-homem será, não o mais duro, mas o mais complexo!
E proclamo também: Terceiro:
O Super-homem será, não o mais livre, mas o mais harmónico!
Proclamo isto bem alto e bem no auge, na barra do Tejo, de costas para a Europa, braços erguidos, fitando o Atlântico e saudando abstractamente o Infinito.


Um livro é um grande cemitério onde, sobre a maioria dos túmulos, não se podem mais ler os nomes apagados.

Sem comentários: