Não é neccessário vivermos ao lado de alguém para nos sentirmos ligados a esse alguém mais do que a qualquer outra pessoa...

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Espaço...Vazio...Peso... Leveza

Um plano geral para a vida deve implicar, antes de mais, alcançar-se qualquer forma de estabilidade financeira.(...) A coisa essencial que vem logo a seguir é residir numa casa com bastante espaço, espaço quanto a divisões e divisões com os requisitos necessários, para arrumar todos os meus papéis e livros na devida ordem; e tudo isto sem grande possibilidade de me mudar dentro de pouco tempo.(...)Substituir, no tocante à ordem dos papéis, a minha caixa grande por caixas mais pequenas contendo os papéis por ordem de importância. Na caixa grande e na outra em A. S. ficariam só os jornais e revistas que guardo.

Como o sinto parecido comigo. Talvez pudesse ter gostado de mim se o nosso espaço - tempo não fosse desencontrado.

Mas quanto amor(...) eu sentia, por vezes, nos meus devaneios, nesses salvamentos pelo belo e sublime: um amor fantástico, claro, que nunca foi concretamente realizado em nada de humano, mas havia tanto desse amor em mim, que depois, concretamente, eu nem sentia a necessidade de o realizar...

A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
Caiu pela escada excessivamente abaixo.
Caiu das mãos da criada descuidada.
Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso.


I can't see the end of me My whole expanse I cannot see I formulate infinity And store it deep inside me...




A Dor - tem um Elemento de Vazio -
Não se consegue lembrar
De quando começou - ou se houve
Um tempo em que não existiu -

Não tem Futuro - para lá de si própria -
O seu Infinito contém
O seu Passado - iluminado para aperceber
Novas Épocas - de Dor.



Caminho, não pelas ruas, mas através da minha dor. As casas alinhadas são os incompreendedores que me cercam na alma. Os meus passos soam no passeio como um dobre ridículo a finados, um ruído de espanto na noite final como um recibo ou uma janela. Separo-me de mim e vejo que sou um fundo dum poço. Morreu quem eu nunca fui. Esqueceu a Deus quem eu havia de ser. Só o interlúdio vazio. Se eu fosse músico escreveria a minha marcha fúnebre, e com que razão a escreveria!

Cerca-me um vazio absoluto de fraternidade e de afeição. Mesmo os que me são afeiçoados não me são afeiçoados; estou cercado de amigos que não são meus amigos e de conhecidos que não me conhecem.

Fragmentos verbais de inveja, de luxúria, de trivialidade vão de embate ao meu sentido de ouvir. Sussurrados murmúrios (...) ondulam para a minha consciência. Pouco a pouco vou perdendo a consciência nítida de que existo coextensamente com isto tudo, de que realmente me movo, ouvindo e pouco vendo, entre sombras que representam entes e lugares onde entes o são. Torna-se-me gradualmente, escuramente, indistintamente incompreensível como é que isto tudo pode ser em face do tempo eterno e do espaço infinito.

A pálida luz da manhã de Inverno,
O cais e a razão
Não dão mais esperança, nem uma esperança sequer,
Ao meu coração.
O que tem que ser
Será, quer eu queira que seja ou que não.
No rumor do cais, no bulício do rio
Na rua a acordar
Não há mais sossego, nem um vazio sequer,
Para o meu esperar.
O que tem que não ser
Algures será, se o pensei; tudo mais é sonhar.


Estou vazio como um poço seco Não tenho verdadeiramente realidade nenhuma Tampa no esforço imaginativo!

Indiferença relativamente ao conteúdo, valorização da forma; comunicação sem finalidade, desejo de falar m a respeito de nada. Comunicar por comunicar, sem qualquer finalidade. Esta é a lógica do vazio: isolamento do ser social e a valorização do ser individual.
CAPÍTULO I – Sedução non stop
CAPÍTULO II - A indiferença pura
CAPÍTULO III - Narciso ou a estratégia do vazio
CAPÍTULO IV - Modernismo e pós-modernismo
CAPÍTULO V . A sociedade humorística
CAPÍTULO VI - Violências selvagens, violências modernas
Tempo de fuga perante qualquer sinal de sentimentalismo. Desenvolvem -se as possibilidades de encontros, mas aumenta a solidão; quanto mais as relações se tornam livres de restrições, mais rara se torna a possibilidade de uma relação afetiva intensa.

Suspirou de alívio ao ouvir o ruído do elevador descendo. Num gesto maquinal, sem se lembrar do estado em que se encontrava, afastou a tampa do ralo da porta e espreitou para fora. Era como se houvesse um muro branco do outro lado. Sentia o contacto do aro metálico na arcada supraciliar, roçava com as pestanas a minúscula lente, mas não os podia ver, a insondável brancura cobria tudo. Sabiaque estava na sua casa, reconhecia-a pelo odor, pela atmosfera, pelo silêncio, distinguia os móveis e os objectos só de tocar-lhes, passar-lhes os dedos por cima, ao de leve, mas era também como se tudo isto estivesse já a diluir-se numa espécie de estranha dimensão, sem direcções nem referências, sem norte nem sul, sem baixo nem alto. Como toda a gente provavelmente o fez, jogara algumas vezes consigo mesmo, na adolescência, ao jogo do E se eu fosse cego, e chegara à conclusão, ao cabo de cinco minutos com os olhos fechados, de que a cegueira, sem dúvida alguma uma terrível desgraça, poderia, ainda assim, ser relativamente suportável se a vítima de tal infelicidade tivesse conservado uma lembrança suficiente, não só das cores, mas também das formas e dos planos, das superfícies e dos contornos, supondo, claro está, que a dita cegueira não fosse de nascença. Chegara mesmo ao ponto de pensar que a escuridão em que os cegos viviam não era, afinal, senão a simples ausência da luz, que o que chamamos cegueira era algo que se limitava a cobrir a aparência dos seres e das coisas, deixando-os intactos por trás do seu véu negro. Agora, pelo contrário, ei-lo que se encontrava mergulhado numa brancura tão luminosa, tão total, que devorava, mais do que absorvia, não só as cores, mas as próprias coisas e seres, tornandoos, por essa maneira, duplamente invisíveis.




Peso ou leveza? Segundo Parménides, filósogo grego do século VI aC, o universo estava dividido em pares antitéticos: luz-sombra; ativo-passivo; masculino-feminino; espesso-fino; quente-frio; ser-não ser; leve-pesado; fogo-terra; vida-morte. Considerava também que um dos pólos da dicotomia era sempre positivo e o outro negativo: a sombra é a negação da luz e o mesmo se passa nos outros pares de opostos. Portanto, para Parménides a leveza é positivo e o pesado, negativo. Teria razão?

O insustentável peso da leveza...
Quanto mais leve e mais pequeno melhor: Ouvimos toda a música do mundo por meio de aparelhos leves como o ar. Vemos filmes em tablets que cabem no bolso.

Estamos apenas nos primeiros passos, mas todos os dias conquista novos territórios, realiza novas proezas, suscita novas esperanças e, ao mesmo tempo, novas angústias. Da cloud computing às biotecnologias, dos nano-objectos aos aparelhos de alta tecnologia, do culto da magreza à alimentação light, dos desportos com prancha às técnicas de relaxamento, das tendências da moda às indústrias do entretenimento, é através de uma multidão de dispositivos heteróclitos e multiformes que evolui a revolução hipermoderna do ligeiro.
O leve, aquilo que era mais insignificante e mais fútil, tornou-se a maior força de transformação do mundo. Na era da hipermodernidade, não é o poder sobre o pesado que muda a face do mundo, mas sim o poder sobre o ultra-leve. Na época que se inicia, o domínio técnico do infinitamente pequeno é aquilo que abre infinitamente o horizonte dos possíveis, tornando real o que, até então, era considerado impossível. Note-se que esta dinâmica está longe de estar igualmente desenvolvida em todas as esferas. As grandes infraestruturas, o gigantismo e os equipamentos faraónicos não estão em vias de extinção. Muito pelo contrário, até os bancos se tornaram too big to fail. No entanto, o princípio da leveza não deixa de progredir a uma velocidade estonteante e de chegar a cada vez mais setores: energia, aeronáutica, telecomunicações, automóveis, banca, cirurgia, mas também jogos, música, fotografia, cinema, arquitetura, design.
De resto, civilização do ligeiro significa tudo menos viver de forma leve. Embora o peso das normas sociais se tenha aligeirado, a vida parece mais pesada. Desemprego, precariedade, instabilidade dos casais, emprego de tempo sobrecarregado, riscos sanitários – perguntamo-nos se isto não alimentará a sensação de gravidade da vida. Por toda a parte se multiplicam os sinais de desamparo, as novas expressões do «mal-estar na civilização». Os dispositivos leves podem abundar, mas os mecanismos do mercado e a dinâmica de individualização não deixam de continuar a produzir inúmeros danos.
Ironia hipermoderna: atualmente, é a leveza que alimenta o espírito de gravidade. Isto porque a leveza se acompanha de normas exigentes com efeitos esgotantes e, por vezes, deprimentes: ter um corpo esbelto implica normalmente a renúncia à tranquilidade do carpe diem, uma existência nos antípodas de uma vida despreocupada. O próprio consumo impõe-se, para grandes frações da população, como fonte de preocupações quotidianas e de práticas que se assemelham a um «trabalho» feito de pesquisas e de comparações pacientes e sérias.
E é mais pesado não ser feliz numa sociedade que celebra o ideal de leveza hedonista do que nas sociedades que ensinavam, como no passado, a resignação na Terra tendo em vista a salvação no Além. O nosso mundo deu origem a desejos de felicidade impossíveis de satisfazer; daí a multiplicação das desilusões relativas a uma vida que nunca é suficientemente leve, divertida ou móvel. O sentimento gracioso da existência recua enquanto triunfam a cultura do divertimento e as disposições materiais do ultraleve. A época foi dominada por um novo «espírito de gravidade»
.

Ai a inevitável leveza da sociologia...Prefiro sempre o inevitável peso do pensamento filosófico...Gilles Lipovetsky é mais sociólogo do que filósofo: paradoxalmente, neste livro, um exemplo de leveza...

Eterno retorno: o maior peso ou a maior leveza?

E se, um dia ou uma noite, um demónio se viesse introduzir na tua suprema solidão e te dissesse: “Esta existência, tal como tu a levas e a levaste até aqui, vai-te ser necessário recomeçá-la sem cessar, sem nada de novo; muito pelo contrário. A menor dor, o menor prazer,o menor pensamento, o menor suspiro, e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande na tua vida há de retornar, e tudo na mesma ordem e sequência – e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez – e tu com ela, ínfima poeira da poeira!“ Não te lançarias ao chão, não rangerias os dentes e amaldiçoarias o demónio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderias: “Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!” Se esse pensamento te dominasse, talvez te transformasse e talvez te aniquilasse; havias de te perguntar a propósito de tudo:" Queres isto? E quere-lo outra vez? Uma vez? Sempre? Até ao infinito?" E esta questão pesaria sobre ti como um peso decisivo e terrível! Ou então, ah!, como será necessário que te ames a ti próprio e que ames a vida para nunca mais desejar outra coisa além desta suprema confirmação!


Quanto mais pesado o fardo, mais próxima da terra está a nossa vida, e mais ela é real e verdadeira. Por outro lado, a ausência total de fardo faz com que o ser humano se torne mais leve do que o ar, com que ele voe, se distancie da terra, do ser terrestre, faz com que ele se torne semi-real, que os seus movimentos sejam tão livres quanto insignificantes. Então, o que escolher? O peso ou a leveza?

Não existe meio de verificar qual é a boa decisão, pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? É isso que faz com que a vida pareça sempre um esboço. No entanto, mesmo ‘esboço’ não é a palavra certa porque um esboço é sempre um projeto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço que é a nossa vida não é o esboço de nada, é um esboço sem quadro.


De que serve? O que é que tem que servir? Pálido esboço leve Do sol de Inverno sobre meu leito a sorrir... Vago sussurro breve.

À leve embriaguez da febre ligeira, quando um desconforto mole e penetrante e frio pelos ossos doridos fora e quente nos olhos sob têmporas que batem — a esse desconforto quero como um escravo a um tirano amado. Dá-me aquela quebrada passividade trémula em que entrevejo visões, viro esquinas de ideias e entre entrepolamentos de sentimentos me desconcerto. Pensar, sentir, querer, tornam-se uma só confusa coisa. As crenças, as sensações, as coisas imaginadas e as actuais estão desarrumadas, são como o conteúdo misturado no chão, de várias gavetas subvertidas.

É uma brisa leve
Que o ar um momento teve
E que passa sem ter
Quase por tudo ser.
Quem amo não existe.
Vivo indeciso e triste.
Quem quis ser já me esquece
Quem sou não me conhece.
E em meio disto o aroma
Que a brisa traz me assoma
Um momento à consciência
Como uma confidência
.

Bóiam leves, desatentos,
Meus pensamentos de mágoa
Como, no sono dos ventos,
As algas, cabelos lentos
Do corpo morto das águas.


Eis que ao despedir-vos, esse teu amigo te diz que ele não é esse teu amigo mas sim um seu irmão gémeo. Imediatamente uma alteração profunda se instalou nas vossas relações. Mas se te perguntares em quê, não é fácil responderes. Naturalmente dirias que esse teu amigo não era ele, que era outra pessoa. Mas outra em quê? O corpo é igual nos mínimos pormenores, igual a face e os gestos e a voz e os olhos. Iguais as ideias, os sentimentos, as recordações, o todo integral da sua vida e do que ele é. Se percorreres todos os pormenores, encontrá-los-ás em hipótese absolutamente iguais. Começa onde quiseres, examina cada minúcia que constitui o teu amigo, progride até ao mais extremo limite e verificarás que nada escapa a uma integral igualdade. Mas se isto é assim, deveria ser-te indiferente seres amigo deste como eras amigo do outro. Pois se uma pessoa é aquilo que ela nos é, se uma pessoa é aquilo que a manifesta, se aquilo que nos define é aquilo que somos e se esse alguém que encontrámos em nada difere, em hipótese, do alguém que esperávamos encontrar, nenhuma razão havia para que as relações com ele se perurbassem. Mas elas perturbam-se, porque esse alguém não é o outro. Em quê, porém, não é o outro? E eis que se levanta agora flagrante essa coisa obscura que determina o «tu» de alguém. Não é nada. E é tudo. Porque toda a sua pessoa está naquilo que a diz - e no entanto não está. Toda a sua pessoa se revela no que vem à superfície ou aí se anuncia, e no entanto alguma coisa ficou ainda atrás, indizível e inacessível, fugidia e flagrante - início puro e categórico, intocável e nula realidade, e no entanto fulgurante e categórica realidade. Está aí e não se vê, assinala uma irredutibilidade e todavia personifica-se em tudo o que a manifesta. É cognoscível e furta-se, é inegável e não podemos apreendê-la. Mas é essa indizibilidade, essa coisa nenhuma, esse quid real, que marca e determina a verdade de se ser uma pessoa e não outra.

Para realizar um sonho é preciso esquecê-lo, distrair dele a atenção. Por isso realizar é não realizar. A vida está cheia de paradoxos como as rosas de espinhos. Eu desejaria fazer a apoteose de uma incoerência nova, que ficasse sendo como que a constituição negativa da nova anarquia das almas. Compilar um digesto dos meus sonhos pareceu-me sempre que seria útil à humanidade. Por isso nunca me abstive de o tentar.(...) A academia vegetal dos silêncios... o teu nome soando como as papoilas... os tanques... o meu regresso... o padre louco que endoideceu na missa. Estas recordações são dos meus sonhos... Não fecho os olhos mas não vejo nada... Não estão aqui as coisas que vejo...Águas… A tortura do destino! Quem sabe se morrerei amanhã! Quem sabe se não vai acontecer-me hoje qualquer coisa de terrível para a minha alma!... Às vezes, quando penso nestas coisas, apavora-me a tirania suprema que nos faz ter de olhar puros não sabendo de que acontecimento a incerteza de mim vai ao encontro.


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